Por que essa revisão é importante?
A depressão grave caracteriza-se por humor depressivo, perda de interesse ou prazer, diminuição da energia, fadiga, dificuldades de concentração, alterações no apetite, distúrbios do sono e pensamentos mórbidos de morte. A depressão muitas vezes se apresenta junto com ansiedade. A depressão e a ansiedade têm impactos negativos sobre a pessoa afetada e sobre a sociedade, muitas vezes a longo prazo.
A quem essa revisão pode interessar?
Profissionais de saúde, incluindo médicos de clínica geral e psiquiatras; pessoas com depressão grave e as pessoas ao seu redor.
Qual pergunta esta revisão busca responder?
A depressão grave é frequentemente tratada pela combinação de medicamentos antidepressivos com benzodiazepínicos. Os benzodiazepínicos são uma família de remédios hipnóticos e que diminuem a ansiedade (ansiolíticos). Esta revisão perguntou se o tratamento com antidepressivo mais benzodiazepínico, comparado com o tratamento apenas com antidepressivo, teria um efeito sobre os sintomas depressivos e a taxa de recuperação, e qual seria a aceitabilidade desses tratamentos baseado no número de pessoas que deixaram o estudo mais cedo (taxa de abandono), em adultos com depressão grave.
Quais estudos foram incluídos na revisão?
Fizemos buscas em bases de dados para encontrar todos os estudos relevantes em adultos com depressão grave. Incluímos apenas ensaios clínicos randomizados controlados aleatórios (ECR). Esse é um tipo de estudo no qual os participantes foram sorteados para receber antidepressivos mais benzodiazepínicos ou apenas antidepressivos. A última busca por estudos foi feita em 23 de maio de 2019.
Encontramos 10 estudos relevantes envolvendo 731 pessoas. Esses estudos compararam o tratamento combinado (antidepressivos mais benzodiazepínicos) versus o tratamento apenas com antidepressivos. A qualidade da evidência variou de muito baixa a moderada.
O que a evidência da revisão nos diz?
A combinação de antidepressivos e benzodiazepínicos foi mais eficaz do que apenas os antidepressivos para melhorar a depressão e reduzir os sintomas na fase inicial do tratamento (uma a quatro semanas), mas não houve evidência de diferença nas avaliações feitas depois desse período. Não houve evidência de diferença na aceitabilidade (baseado na taxa de abandono) entre o tratamento combinado versus o tratamento apenas com os antidepressivos. As taxas de abandono devido a efeitos colaterais foram menores no grupo que recebeu antidepressivos mais benzodiazepínicos comparado com o grupo que recebeu apenas antidepressivos. Porém, pelo menos um efeito colateral foi relatado mais frequentemente pelas pessoas tratadas com a combinação de antidepressivos mais benzodiazepínicos.
O que deveria acontecer a seguir?
Devido ao potencial das pessoas se tornarem dependentes benzodiazepínicos, novos estudos de longo prazo precisam comparar o que acontece quando o tratamento combinado envolve a retirada benzodiazepínicos após um curto período (por exemplo, um mês).
A terapia combinada de antidepressivos mais benzodiazepínicos foi mais efetiva do que o uso dos antidepressivos isolados para melhorar a gravidade da depressão, a resposta à depressão e a remissão da depressão na fase inicial. Porém, estes efeitos não persistiram na fase aguda ou contínua da depressão. Houve menos abandonos devido a eventos adversos nos pacientes tratados com terapia combinada do que naqueles tratados apenas com antidepressivos. Porém, a terapia combinada foi associada a uma maior proporção de participantes que relataram pelo menos um efeito adverso.
A evidência de qualidade moderada dos benefícios de adicionar um benzodiazepínico a um antidepressivo na fase inicial deve ser cuidadosamente pesada em relação aos seus possíveis danos e deve-se considerar outras estratégias alternativas de tratamento quando a monoterapia com antidepressivos for considerada inadequada. Precisamos de ensaios clínicos randomizados pragmáticos de longo prazo para comparar a terapia antidepressiva combinada versus monoterapia em pacientes com depressão grave.
A ansiedade coexiste frequentemente com a depressão e adicionar benzodiazepínicos ao tratamento antidepressivo é comum no tratamento de pessoas com depressão grave. Porém, é necessário mais evidência para determinar se este tratamento combinado é mais efetivo e não é mais prejudicial do que o tratamento com os antidepressivos isolados. Tem sido sugerido que os benzodiazepínicos podem perder sua eficácia com a administração a longo prazo e o uso crônico está associado ao risco de dependência.
Esta é a versão atualizada de uma Revisão Cochrane publicada pela primeira vez em 2001, e atualizada anteriormente em 2005. Esta atualização segue um novo protocolo para estar em conformidade com as mais recentes diretrizes metodológicas da Cochrane, com a inclusão de tabelas de 'Resumo dos resultados' e avaliações GRADE da qualidade da evidência.
Avaliar os efeitos da combinação de antidepressivos com benzodiazepínicos versus antidepressivos isolados para o tratamento de adultos com depressão grave.
Fizemos buscas nas seguintes bases de dados em maio de 2019: Cochrane Common Mental Disorders Group's Controlled Trials Register (CCMDCTR), Cochrane Central Register of Controlled Trials, MEDLINE, Embase e PsycINFO. Fizemos buscas nas plataformas de registro de ensaios clínicos da OMS e no ClinicalTrials.gov para identificar estudos adicionais não publicados ou em curso.
Incluímos ensaios clínicos randomizados controlados (ECR) que compararam antidepressivo mais benzodiazepínicos versus antidepressivos isolados no tratamento de adultos com depressão grave. Excluímos estudos que ofereceram terapias psicossociais dirigidas à depressão e aos distúrbios de ansiedade simultaneamente. Os antidepressivos tinham de ser prescritos, em média, na dose mínima efetiva ou maior segundo Hansen 2009 ou de acordo com os regulamentos norte-americanos ou europeus. A terapia combinada deveria ter duração de pelo menos quatro semanas.
Dois autores da revisão, trabalhando de forma independente, fizeram a extração dos dados e avaliaram o risco de viés dos estudos incluídos, de acordo com os critérios do Manual de Revisões Sistemáticas de Intervenções da Cochrane. Inserimos os dados no Review Manager 5. Fizemos análises segundo a intenção de tratamento. Nas metanálises de dados contínuos para gravidade da depressão e ansiedade, usamos diferenças médias padronizadas (SMD) e seus intervalos de confiança (IC) de 95%. Nas metanálises de desfechos de eficácia com variáveis dicotômica, calculamos a razão de risco (RR) e seu IC de 95%. Para o desfecho primário de aceitabilidade, todos os estudos apresentaram apenas a taxa geral de abandono.
Identificamos 10 estudos publicados entre 1978 e 2002, envolvendo 731 participantes. Seis estudos utilizaram antidepressivos tricíclicos (TCAs), dois estudos utilizaram inibidores seletivos de recaptação de serotonina (SSRIs), um estudo utilizou outro antidepressivo heterocíclico e um estudo utilizou TCA ou antidepressivo heterocíclico.
A terapia combinada de benzodiazepínicos mais antidepressivos foi mais efetiva do que apenas os antidepressivos na fase inicial (quatro semanas) (SMD -0,25, IC 95% -0,46 a -0,03; 10 estudos, 598 participantes; evidência de qualidade moderada), mas não houve diferença entre os tratamentos na fase aguda (cinco a 12 semanas) (SMD -0.18, IC 95% -0,40 a 0,03; 7 estudos, 347 participantes; evidência de baixa qualidade) ou na fase contínua (mais de 12 semanas) (SMD -0,21, IC 95% -0,76 a 0,35; 1 estudo, 50 participantes; evidência de baixa qualidade). Para a aceitabilidade do tratamento, não houve diferença nos abandonos por qualquer motivo entre terapia combinada versus antidepressivos isolados (RR 0,76, IC 95% 0,54 a 1,07; 10 estudos, 731 participantes; evidência de qualidade moderada).
Para resposta à depressão, a terapia combinada foi mais efetiva do que os antidepressivos isolados na fase inicial (RR 1,34, IC 95% 1,13 a 1,58; 10 estudos, 731 participantes), mas não houve evidência de diferença na fase aguda (RR 1,12, IC 95% 0,93 a 1,35; 7 estudos, 383 participantes) ou na fase contínua (RR 0,97, IC 95% 0,73 a 1,29; 1 estudo, 52 participantes). Para remissão da depressão, a terapia combinada foi mais efetiva do que os antidepressivos isolados na fase inicial (RR 1,39, IC 95% 1,03 a 1,90, 10 estudos, 731 participantes), mas não houve evidência de diferença na fase aguda (RR 1,27, IC 95% 0,99 a 1,63; 7 estudos, 383 participantes) ou na fase contínua (RR 1,31, IC 95% 0,80 a 2,16; 1 estudo, 52 participantes). Não houve evidência de diferença entre a terapia combinada e os antidepressivos isolados para gravidade da ansiedade na fase inicial (SMD -0,76, IC 95% -1,67 a 0,14; 3 estudos, 129 participantes) ou na fase aguda (SMD -0,48, IC 95% -1,06 a 0,10; 3 estudos, 129 participantes). Nenhum estudo avaliou gravidade da insônia. As taxas de abandono devido a eventos adversos foram menores no grupo de terapia combinada do que no grupo dos antidepressivos isolados (RR 0,54, IC 95% 0,32 a 0,90; 10 estudos, 731 participantes; evidência de qualidade moderada). Porém, os participantes do grupo de terapia combinada relataram pelo menos um efeito adverso mais frequentemente do que os participantes do grupo dos antidepressivos isolados (RR 1,12, IC 95% 1,01 a 1,23; 7 estudos, 510 participantes; evidência de qualidade moderada).
O risco de viés foi incerto para a maioria dos domínios na maioria dos estudos incluídos na revisão. A geração de sequência aleatória, a ocultação da alocação, o cegamento e o relato seletivo dos desfechos foram problemáticos devido à falta de detalhes na maioria dos estudos e à falta de disponibilidade dos protocolos dos estudos. A maior limitação na qualidade dos estudos foi o viés de atrito.
Tradução do Cochrane Brazil (Maria Regina Torloni). Contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br