Os medicamentos anticonvulsivantes são tratamentos efetivos e seguros para a síndrome de Lennox-Gastaut?

Por que esta pergunta é importante?

A síndrome de Lennox-Gastaut é um tipo grave de epilepsia que afeta principalmente crianças. O principal sintoma da síndrome de Lennox-Gastaut são os frequentes e múltiplos tipos de convulsões. As convulsões são causadas por surtos repentinos e descontrolados de atividade elétrica anormal no cérebro. As convulsões são difíceis de tratar com medicamentos anticonvulsivantes. Muitos anticonvulsivantes diferentes são administrados para tentar parar as convulsões. Dois ou três anticonvulsivantes são frequentemente administrados ao mesmo tempo, o que é conhecido como polifarmácia. Não está claro quais medicamentos são mais efetivos. A maioria das pessoas com síndrome de Lennox-Gastaut também tem dificuldades de aprendizagem e comportamentais.

Como encontramos e avaliamos as evidências?

Fizemos buscas na literatura médica para encontrar ensaios clínicos randomizados (ECRs) que avaliaram os efeitos de medicamentos anticonvulsivantes para o tratamento da síndrome de Lennox-Gastaut. Incluímos qualquer ECR que comparasse anticonvulsivantes, seja como monoterapia ou terapia adjuvante (complementar), com placebo (tratamento de mentira), nenhum tratamento ou outro tipo de tratamento. Em seguida, comparamos os resultados dos ECRs que encontramos e resumimos as evidências de todos os estudos. Classificamos nossa 'certeza' (confiança) nas evidências, com base em fatores como os métodos e tamanhos dos estudos e a consistência (concordância) dos resultados entre os estudos.

Características dos estudos

Esta revisão incluiu 11 estudos (1.277 participantes, que incluíram crianças, adolescentes e adultos). Os estudos duraram entre cerca de 11 semanas e 112 semanas após a randomização. Nenhum dos estudos incluídos comparou um anticonvulsivante sozinho com outro tratamento. Dois estudos compararam regimes de adição de canabidiol (medicamentos à base de cannabis) com regimes de adição de placebo (396 crianças, adolescentes e adultos). Um estudo comparou a adição de cinromida com a adição de placebo (somente 56 crianças e adolescentes). Um estudo comparou a adição de clobazam com a adição de placebo (238 participantes). Um estudo comparou a adição de felbamato com a adição de placebo (73 participantes). Dois estudos compararam ae adição de lamotrigina com a adição de placebo (186 participantes). Dois estudos compararam a adição de rufinamida com a adição de placebo (197 participantes). Um estudo comparou a adição de rufinamida com a adição de outro anticonvulsivante (37 participantes). Um estudo comparou a adição de topiramato com a adição de placebo (98 participantes).

A maioria das evidências nesta revisão relacionava-se às pessoas de países de média ou alta renda e, quando relatado, participantes de etnia branca.

Resultados e certeza (qualidade/confiança) nas evidências

Encontramos evidências de alta certeza de que a adição de lamotrigina aumentou o número de participantes com redução de pelo menos 50% no número médio de convulsões relatadas. Também encontramos evidências de baixa certeza de que a adição de lamotrigina pode ter reduzido o número de participantes com eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo em comparação com a adição de placebo.

Encontramos evidências de alta certeza de que a adição de rufinamida aumentou o número de participantes com redução de pelo menos 50% no número médio de convulsões relatadas, em comparação com a adição de placebo. Também encontramos evidências de baixa certeza de que a adição de rufinamida pode ter pouca ou nenhuma diferença de efeito na redução do número de participantes com eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo, em comparação com a adição de placebo ou outro anticonvulsivante não especificado.

Encontramos evidências de baixa certeza de que a adição de topiramato pode ter aumentado o número de participantes com redução de pelo menos 75% no número médio de convulsões relatadas e provavelmente fez pouca ou nenhuma diferença no número de eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo, em comparação com adição de placebo.

Encontramos evidências de baixa certeza de que a adição de felbamato (fase de tratamento) pode ter feito pouca ou nenhuma diferença em termos de relato de ausência de convulsões e eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo, em comparação com a adição de placebo. No entanto, encontramos evidências de baixa certeza de que quando as convulsões foram registradas em um ambiente de pesquisa, a adição de felbamato pode ter aumentado a ausência de convulsões em comparação com a adição do placebo.

Temos dúvidas se outras terapias medicamentosas adicionais, incluindo canabidiol, cinromida e clobazam, reduziram todos os tipos de convulsões. Isto porque este desfecho não foi relatado ou tinha evidência de baixa certeza. Encontramos evidências de alta certeza de que a adição de canabidiol e clobazam aumentaram o número de participantes com eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo, em comparação com placebo. Não encontramos nenhuma evidência de eventos adversos que levassem à descontinuação do estudo sobre a adição de cinromida em comparação com a adição de placebo.

As evidência estão atualizadas até março de 2020.

Conclusão dos autores: 

Atualmente, faltam ECRs de monoterapia e comparação direta de anticonvulsivantes adjuvantes. No entanto, encontramos evidências de alta certeza para redução geral de convulsões com a adição de lamotrigina e rufinamida, com evidência de baixa certeza para eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo em comparação com a adição de placebo ou de outro anticonvulsivante. A evidência sobre outros anticonvulsivantes adjuvantes para a cessação ou redução geral das convulsões foi baixa a muito baixa, com evidência de alta a baixa certeza para eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo.

Pesquisas futuras devem considerar relatos dos desfechos de redução geral de convulsões (aplicando dispositivos automatizados de detecção de convulsões), impacto no desenvolvimento, cognição e comportamento. Além disso, pesquisas futuras devem investigar a eficácia específica relacionada à idade dos anticonvulsivantes e etiologias alvo subjacentes.

Leia o resumo na íntegra...
Introdução: 

A síndrome de Lennox-Gastaut é uma síndrome epiléptica específica da idade caracterizada por vários tipos de convulsões. As pessoas com síndrome de Lennox-Gastaut têm sintomas que iniciam antes dos oito anos de idade, manifestam resistência a medicamentos e apresentam um eletroencefalograma característico.

Esta é uma atualização de uma revisão Cochrane publicada em 2013.

Objetivos: 

Avaliar a eficácia e tolerabilidade de medicamentos anticonvulsivantes para síndrome de Lennox-Gastaut.

Métodos de busca: 

Fizemos buscas no Cochrane Register of Studies (CRS Web) e no MEDLINE (Ovid, 1946 a 28 de fevereiro de 2020) em 2 de março de 2020. A CRS Web inclui ensaios clínicos randomizados (ECRs) ou quase-randomizados da Cochrane Central Register of Controlled Trials (CENTRAL); os Specialised Registers of Cochrane Review Groups, incluindo o Cochrane Epilepsy; PubMed; Embase; ClinicalTrials.gov; e a World Health Organization's International Clinical Trials Registry Platform. Não aplicamos nenhuma restrição quanto ao idioma. Entramos em contato com empresas farmacêuticas e colegas da área para buscar estudos não publicados ou em andamento.

Critério de seleção: 

Consideramos para inclusão nesta revisão, ECRs, incluindo ensaios clínicos do tipo cross-over, sobre anticonvulsivantes para síndrome de Lennox-Gastaut em crianças e adultos. Incluímos estudos sobre anticonvulsivantes usados como monoterapia ou como terapia adjuvante (adicional). Excluímos estudos que compararam diferentes doses do mesmo anticonvulsivante.

Coleta dos dados e análises: 

Usamos os procedimentos metodológicos padrão da Cochrane, que inclui a avaliação independente e em duplicidade do risco de viés e a aplicação da abordagem GRADE para avaliar a certeza nas evidências para os desfechos.

Principais resultados: 

Não encontramos estudos sobre anticonvulsivantes como monoterapia. Incluímos 11 estudos (com um total 1.277 participantes; com aproximadamente 11 semanas a 112 semanas de acompanhamento após a randomização) que usaram anticonvulsivantes adjuvantes para síndrome de Lennox-Gastaut em crianças, adolescentes e adultos.

Dois estudos compararam a adição de canabidiol (duas doses) com a adição de placebo em crianças, adolescentes e adultos. Informações insuficientes foram fornecidas para o cálculo das diferentes proporções da taxa de resposta em todas as convulsões. Encontramos evidências de alta certeza de que 82 pessoas a mais por 1.000 (intervalo de confiança (IC) 19 a 350 a mais) tiveram eventos adversos (EA) que levaram à descontinuação do estudo com a adição de canabidiol, em comparação com placebo (dois estudos; 396 participantes; risco relativo (RR) 6,62, IC 95% 1,56 a 28,15).

Um estudo comparou a adição da cinromida com a adição do placebo apenas em crianças e adolescentes. Encontramos evidências de certeza muito baixa de que 35 pessoas a mais por 1.000 (IC 123 a menos a 434 a mais) tiveram uma redução média de 50% ou mais das convulsões gerais com a adição da cinromida em comparação com a adição do placebo (um estudo; 56 participantes; RR 1,15, 95% IC 0,47 a 2,86). Este estudo não relatou a presença de participantes com eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo.

Um estudo comparou a adição do clobazam (três doses) com a adição do placebo. Este estudo não relatou cessação ou redução geral das convulsões. Encontramos evidências de alta certeza de que 106 pessoas a mais por 1.000 (IC 0 a 538 a mais) tiveram eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo com a adição do clobazam em comparação com a adição do placebo (um estudo; 238 participantes; RR 4,12, IC 95% 1,01 a 16,87).

Um estudo comparou a adição do felbamato com a adição do placebo. Nenhum caso de cessação das convulsões ocorreu em nenhum dos regimes durante a fase de tratamento (um estudo; 73 participantes; baixa certeza na evidência). Encontramos evidências de baixa certeza de que 53 pessoas a mais por 1.000 (IC 19 a menos a 716 a mais) com a adição do felbamato ficaram livres de convulsões durante um EEG no final da fase de tratamento, em comparação com a adição do placebo (RR 2,92 , 95% IC 0,32 a 26,77). O estudo não relatou redução geral das convulsões. Encontramos evidências de baixa certeza de que uma pessoa a menos por 1.000 (IC 26 a menos a 388 a mais) com a adição do felbamato teve eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo, em comparação com a adição do placebo (um estudo, 73 participantes; RR 0,97, IC 95% 0,06 a 14,97).

Dois estudos compararam a adição da lamotrigina com a adição do placebo. Nenhum estudo relatou a cessação geral das convulsões. Encontramos evidências de alta certeza de que 176 pessoas a mais por 1.000 (IC 30 a mais a 434 a mais) tiveram ≥ 50% de redução média das convulsões com a adição da lamotrigina, em comparação com a adição do placebo (um estudo; 167 participantes; RR 2,12, IC 95% 1,19 a 3,76). Encontramos evidências de baixa certeza de que 40 pessoas a menos por 1.000 (IC 68 a menos a 64 a mais) tiveram eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo com a adição da lamotrigina, em comparação com a adição do placebo (um estudo; 169 participantes; RR 0,49, IC 95% 0,13 a 1,82).

Dois estudos compararam a adição da rufinamida com a adição do placebo. Nenhum estudo relatou a cessação das convulsões. Encontramos evidências de alta certeza de que 202 pessoas a mais por 1.000 (IC 34 a 567 a mais) tiveram ≥ 50% de redução média das convulsões (um estudo; 138 participantes; RR 2,84, IC 95% 1,31 a 6,18). Encontramos evidências de baixa certeza de que 105 pessoas a mais por 1.000 (IC 17 a menos a 967 a mais) tiveram eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo com a adilção da rufinamida em comparação com a adição do placebo (um estudo; 59 participantes; RR 4,14, IC 95% 0,49 a 34,86). Um estudo comparou a adição da rufinamida com a adição de outro anticonvulsivante. Este estudo não relatou cessação ou redução geral das convulsões. Encontramos evidências de baixa certeza de que três pessoas a menos por 1.000 (IC 75 a menos a 715 a mais) tiveram eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo com a adição da rufinamida em comparação com a adição de outro anticonvulsivante (um estudo; 37 participantes; RR 0,96, IC 95% 0,10 a 9,57).

Um estudo comparou a adição do topiramato com a adição do placebo. Este estudo não relatou a cessação geral das convulsões. Encontramos evidências de baixa certeza para a redução média das convulsões ≥ 75% com a adição de topiramato (um estudo; 98 participantes; Peto odds ratio (Peto OR) 8,22, IC 99% 0,60 a 112,62) e pouca ou nenhuma diferença para os eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo em comparação com a adição do placebo. Nenhum participante experimentou eventos adversos que levaram à descontinuação do estudo (um estudo; 98 participantes; baixa certeza na evidência).

Notas de tradução: 

Tradução do Cochrane Brazil (Ana Carolina P. Nunes Pinto). Contato: tradutores.cochrane.br@gmail.com

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