Avaliamos a evidência proveniente de ensaios clínicos randomizados sobre o uso de antibióticos para prevenir infecções nas mulheres que dão à luz por parto vaginal operatório. Queríamos saber se o uso de antibióticos reduziria os riscos de infecção na mãe e no bebê, sem aumentar os riscos de eventos adversos. Dar a luz por parto vaginal operatório significa que o bebê nasce pela vagina mas o médico usa um instrumento (vácuo extrator ou fórcipe) para ajudar a cabeça do bebê a sair.
Qual é o problema?
As mulheres que dão à luz por parto vaginal operatório podem ter mais risco de ter alguma infecção depois do parto do que as que têm um parto vaginal não-operatório (chamado de ´parto vaginal espontâneo´). Elas também têm mais risco de precisar ser reinternadas. Essas mulheres correm maior risco de infecção devido à necessidade de sondagem vesical, dos múltiplos exames de toque, da introdução de instrumentos na vagina e do aumento do risco de incisões profundas ou lacerações vaginais durante o parto operatório. A infecção pode se manifestar como febre, ou infecção do útero, dos tecidos adjacentes, da episiotomia ou das lacerações vaginais, ou por infecção do trato urinário. Essas infecções podem comprometer o bem estar e a saúde física da mulher. Os germes responsáveis pela infecção podem também entrar na corrente sanguínea e a infecção pode afetar todo o corpo.
Porque isto é importante?
O vácuo extrator ou fórcipe são utilizados para abreviar o período expulsivo, principalmente se ele se prolonga demais ou se o bebê mostrar sinais de sofrimento. O período expulsivo faz parte da segunda fase do parto; ele se inicia quando o colo do útero está completamente dilatado e termina com o nascimento do bebê. Os antibióticos podem ser administrados às mães no momento do parto para prevenir ou reduzir o risco de infecção. Porém, ainda existem algumas dúvidas sobre o benefício do uso dos antibióticos nesses casos. Os antibióticos também podem causar reações adversas como erupções cutâneas ou diarreia na mãe, e podem passar pelo leite materno expondo o bebê a eles.
Que evidência encontramos?
Fizemos buscas por ensaios clínicos randomizados controlados (um tipo de estudo) que houvessem sido publicados até julho de 2019. Encontramos dois estudos publicados em 1989 e 2019. O estudo mais antigo foi realizado nos EUA e o mais recente em diversos centros obstétricos no Reino Unido. Os estudos incluíram um total de 3813 mulheres com parto vaginal operatório. O estudo dos EUA teve 393 participantes e comparou 2g de Cefotetan intravenoso após o clampeamento do cordão versus não usar antibióticos. O outro estudo teve 3420 participantes e comparou o uso de amoxicilina e ácido clavulânico intravenoso versus placebo. A qualidade da evidência variou de alta a baixa. A qualidade foi rebaixada devido à imprecisão dos resultados, poucos eventos e quando apenas um único estudo relatou determinados desfechos.
O uso de antibióticos profiláticos reduziu pela metade o número de mulheres que tiveram infecção na episiotomia ou nas lacerações. Estes achados incluíram infecções superficiais e profundas das feridas perineais (um estudo, 3420 mulheres; evidência de alta qualidade) ou deiscência de ferida (um estudo, 2593 mulheres; evidência de qualidade moderada). O uso de antibióticos profiláticos também reduziu as complicações infecciosas graves (um estudo, 3420 mulheres; evidência de alta qualidade). Existe incerteza sobre o efeito do uso de antibióticos profiláticos sobre endometrite diagnosticada como febre e sensibilidade uterina ou sangramento intenso (dois estudos, 3813 mulheres, evidência de baixa qualidade), e sobre infecção da episiotomia/laceração associada à infecção de órgãos ou do tecido perineal (um estudo, 3420 mulheres, evidência de baixa qualidade).
Também existe incerteza sobre o efeito da intervenção no risco de eventos adversos na mulher (um estudo, 2593 mulheres, evidência de baixa qualidade) e na duração da internação hospitalar (um estudo, 393 mulheres, evidência de baixa qualidade). A intervenção produziu uma pequena redução na dor perineal e suas consequências sobre a saúde da mulher. Não foi identificado um efeito claro do uso dos antibióticos profiláticos sobre a dor durante a relação sexual ou sobre a amamentação avaliadas seis semanas após o parto. A intervenção pode produzir uma pequena melhora na taxa de reinternação e na qualidade de vida relacionada à saúde materna. Os custos foram reduzidos com o uso de antibióticos profiláticos. Nenhum estudo mediu especificamente febre, infecção do trato urinário ou reações adversas nos bebês.
O que isso significa?
O uso de antibióticos profiláticos intra-venosos é eficaz para reduzir os problemas de saúde causados por infecções em mulheres que dão à luz por parto vaginal operatório que não tinham nenhuma indicação clínica para receber antibióticos. A evidência vem principalmente de um único estudo que foi feito em um país de alta renda. Estudos clínicos randomizados em outros locais são necessários para confirmar este achado.
O uso de antibióticos profiláticos intravenosos é efetivo para reduzir a morbidade infecciosa puerperal (infecção superficial e profunda da ferida ou complicações infecciosas graves) em mulheres submetidas a partos vaginais operatórios que não tinham indicação clínica para a administração de antibióticos após o parto. Os antibióticos profiláticos melhoram discretamente a dor perineal e suas consequências sobre a saúde, provavelmente reduzem os custos, e podem reduzir discretamente as taxas de reinternação materna e aumentar discretamente a qualidade de vida das mulheres. Existe evidência de baixa qualidade (certeza) que a intervenção tem efeitos incertos sobre endometrite, infecção de órgãos ou da ferida perineal, reações adversas maternas e tempo de internação hospitalar.
A evidência é proveniente principalmente de um único estudo multicêntrico conduzido em um país de alta renda. Portanto, é necessário fazer novos ECRs bem desenhados, e em outros países, especialmente de baixa e média renda, para confirmar os efeitos do uso de antibióticos profiláticos em mulheres que dão à luz por parto vaginal operatório.
Os partos vaginais operatórios com vácuo extrator ou fórcipe podem aumentar a incidência de infecções pós-parto e reinternação materna, em comparação com o parto vaginal espontâneo. Antibióticos profiláticos podem ser prescritos para prevenir estas infecções. Porém, o benefício da profilaxia antibiótica para partos vaginais operatórios ainda não está claro. Esta é uma atualização de uma revisão publicada em 2017.
Avaliar a efetividade e segurança da profilaxia antibiótica para reduzir a morbidade infecciosa puerperal em mulheres submetidas a partos vaginais operatórios (vácuo, fórcipe, ou ambos).
Para esta atualização, fizemos buscas nas seguintes bases de dados em 5 de julho de 2019: Cochrane Pregnancy and Childbirth Trials Register, ClinicalTrials.gov, WHO International Clinical Trials Registry Platform (ICTRP). Também avaliamos as listas de referências dos estudos recuperados.
Incluímos ensaios clínicos randomizados (ECRs) que compararam qualquer regime de antibiótico profilático versus placebo ou nenhum tratamento em mulheres que tiveram partos com vácuo extrator ou fórcipe. As participantes eram gestantes de qualquer idade gestacional e sem evidência de infecções ou outras indicações de antibióticos. As intervenções foram qualquer profilaxia antibiótica (qualquer regime, via de administração ou momento de administração durante o parto ou o puerpério).
Dois autores da revisão avaliaram a elegibilidade e o risco de viés dos estudos. Dois autores da revisão extraíram os dados de forma independente usando formulários específicos. As discrepâncias foram resolvidas por discussão e o consenso foi alcançado por discussão com todos os autores da revisão. Avaliamos a qualidade da evidência usando a metodologia GRADE.
Incluímos dois estudos, envolvendo 3813 mulheres com partos a vácuo ou fórcipe. Um estudo (393 mulheres) comparou o antibiótico cefotetan intravenoso após o clampeamento do cordão versus nenhum tratamento. O outro estudo (3420 mulheres) comparou uma única dose de amoxicilina intravenosa e ácido clavulânico versus placebo (20 ml de solução salina estéril intravenosa).
A evidência sugere que o uso de antibióticos profiláticos reduz a taxa de infecção superficial de feridas perineais (razão de risco (RR) 0,53, intervalo de confiança (IC) 95% 0,40 a 0,69, N = 3420, 1 estudo, evidência de alta qualidade) e de infecção profunda de feridas perineais (RR 0.46, IC 95% 0,31 a 0,69; N = 3420, 1 estudo, evidência de alta qualidade) e provavelmente reduz a taxa de deiscência (RR 0,52, IC 95% 0,43 a 0,63, N = 2593, 1 estudo, evidência de qualidade moderada). O efeito foi incerto para infecção de órgãos ou do espaço perineal (RR 0,11, IC 95% 0,01 a 2,05 N = 3420, 1 estudo) e endometrite (RR 0,32, IC 95% 0,04 a 2,64, 15/1907 versus 30/1906, N = 3813, 2 estudos). Essa evidência foi de baixa qualidade devido ao tamanho de IC que inclui a possibilidade de nenhum efeito. O uso de antibióticos profiláticos provavelmente reduz as complicações infecciosas graves (RR 0,44, IC 95% 0,22 a 0,89, N = 3420, 1 estudo, evidência de alta qualidade). A intervenção também têm um efeito importante na redução da infecção materna confirmada ou suspeita. Os dois estudos incluídos não avaliaram febre ou infecção do trato urinário.
Não está claro, com base em evidência de baixa qualidade, se os antibióticos profiláticos têm algum impacto sobre as reações adversas maternas (RR 2,00, IC 95% 0,18 a 22,05, N = 2593; 1 estudo) e no tempo de internação (diferença média -MD 0,09 dias, IC 95% -0,23 a 0,41, N = 393, 1 estudo). A qualidade da evidência foi rebaixada devido ao tamanho de IC que inclui a possibilidade de nenhum efeito. O uso de antibióticos profiláticos reduz discretamente a dor perineal e suas consequências, e provavelmente reduz os custos. O uso de antibióticos profiláticos não teve um efeito importante na dispareunia (relação sexual dolorosa) ou na amamentação com seis semanas. A profilaxia antibiótica pode melhorar discretamente a reinternação hospitalar materna e a qualidade de vida materna. Reações adversas neonatais não foram relatadas em nenhum dos estudos incluídos.
Tradução do Cochrane Brazil (Bianca Nigro Fenolio e Maria Regina Torloni). Contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br