Introdução
A aorta abdominal é a principal artéria que fornece sangue à parte inferior do corpo. Com o passar dos anos, a parede dessa artéria pode enfraquecer e ficar abaulada. Isso é chamado de aneurisma da aorta. Esse problema é mais frequente nos homens mais velhos. O aneurisma pode aumentar progressivamente sem provocar sintomas evidentes. Porém, ele é potencialmente letal já que o aneurisma pode estourar (ruptura) e provocar uma grande hemorragia interna. A morte é inevitável a menos que o sangramento seja rapidamente estancado e o fluxo de sangue para a parte inferior do corpo seja reestabelecido. Até recentemente, isso exigia uma operação na qual o médico abria a barriga da pessoa (laparotomia) para pinçar a aorta abdominal e substituir o segmento afetado da aorta por um tubo sintético (enxerto arterial). Apesar dos avanços na técnica cirúrgica e nos cuidados aos pacientes em estado crítico, muitos pacientes não sobrevivem a essa grande cirurgia. Eles morrem devido às consequências da hemorragia maciça ou devido à falência de órgãos vitais como coração, pulmões e rins.
O tratamento endovascular para aneurisma da aorta abdominal roto é uma técnica cirúrgica minimamente invasiva. Nesse tipo de procedimento, ao invés de abrir a barriga do paciente, o médico introduz uma endoprótese (um pequeno tubo) através de um vaso calibroso da virilha e empurra esse tubo até ele chegar no local da ruptura da aorta. Aí o médico posiciona e fixa esse tubo à artéria saudável acima e abaixo do aneurisma roto. Isso faz com que a hemorragia pare e permite que o sangue volte a circular para a parte inferior do corpo passando por esse novo canal. Essa técnica funciona também em pacientes candidatos ao tratamento de aneurismas não rotos, podendo reduzir complicações e mortes pós-operatórias precoces.
Características do estudo e resultados principais
Esta revisão examinou as evidências disponíveis sobre a efetividade do reparo endovascular em comparação com a cirurgia aberta para aneurismas rotos. Incluímos quatro estudos com um total de 868 participantes. No geral, o risco de viés dos estudos foi baixo. Porém, um estudo teve alto risco de viés de seleção devido ao uso do método de randomização em bloco; um estudo não relatou adequadamente os métodos de randomização empregados; e dois estudos podem não ter incluído um número suficiente de participantes que permitisse responder adequadamente às questões colocadas nos estudos. Segundo os dados atualmente disponíveis, não parece haver diferença no risco de morte nos primeiros 30 dias do procedimento entre o reparo endovascular versus o reparo aberto. Quarenta e quatro participantes (incluídos em três estudos) tiveram vazamento de sangue no local onde a endoprótese foi colocada. Os dados existentes sobre complicações (infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral, complicações cardíacas combinadas, complicações renais, isquemia medular, reoperação, amputação e insuficiência respiratória) não são suficientemente robustos para chegarmos a conclusões definitivas quanto à superioridade de qualquer uma das técnicas de reparo. Porém, o reparo endovascular de emergência pode estar associado a um menor risco de isquemia intestinal. Os dados existentes não permitem conclusões seguras sobre os resultados avaliados seis meses ou um ano após os procedimentos. Mais estudos são necessários para saber se uma das técnicas de reparo de aneurisma (endovascular ou cirurgia aberta) é ou não superior, baseado na avalição de resultados clínicos dos pacientes.
Qualidade da evidência
Existe evidência de qualidade moderada sugerindo que não há diferença no risco de morte até 30 dias depois do procedimento entre os pacientes com aneurisma da aorta roto submetidos ao reparo endovascular versus os pacientes submetidos ao reparo aberto. Os dados disponíveis sobre complicações são insuficientes para uma conclusão bem embasada. Porém, é possível que o reparo endovascular de emergência esteja associado a uma redução da isquemia intestinal. Rebaixamos a qualidade da evidência porque alguns estudos tinham um número insuficiente de participantes, nem todos os estudos relataram todas as complicações, e o número de complicações variou bastante entre os estudos.
As conclusões desta revisão são limitadas devido à escassez de dados atualmente disponíveis. Existe evidência de qualidade moderada sugerindo que não há diferença no risco de morte até 30 dias depois do procedimento entre os pacientes com aneurisma da aorta roto submetidos ao reparo endovascular versus os pacientes submetidos ao reparo aberto. Os dados disponíveis sobre complicações são insuficientes para uma conclusão bem embasada. Porém, é possível que o reparo endovascular de emergência esteja associado a uma redução da isquemia intestinal. Não há dados de longo prazo para sobrevida e complicações tardias. São necessários mais ECRs de alta qualidade que comparem eEVAR versus reparo a céu aberto no tratamento de pacientes com AAAR para concluir se um método é superior ao outro ou se não há diferença entre os métodos no que diz respeito aos desfechos relevantes.
O aneurisma da aorta abdominal (AAA) é a dilatação patológica da aorta. Esse problema pode ocorrer à medida que a pessoa envelhece. O AAA é mais comum em homens com mais de 65 anos de idade. O aumento progressivo do aneurisma pode levar à sua ruptura e hemorragia interna grave. Isso pode levar o paciente a óbito a não ser que ele seja submetido à cirurgia de correção em tempo hábil. Apesar da melhora nos cuidados peri operatórios, a mortalidade desses pacientes permanece elevada (aproximadamente 50%) após a cirurgia convencional de correção a céu aberto. Nos casos de cirurgia eletiva para correção de AAA, o reparo endovascular de aneurisma (EVAR), uma técnica minimamente invasiva, tem menor morbidade e mortalidade precoces do que a cirurgia convencional a céu aberto. Mais recentemente, o reparo endovascular de aneurisma de emergência (eEVAR) tem sido usado com sucesso para tratar o aneurisma de aorta abdominal roto (AAAR). Isso prova que esse tipo de cirurgia é viável em pacientes selecionados. Porém, não está claro se o eEVAR traz melhorias significativas nos desfechos desses pacientes ou se pode de fato substituir a cirurgia convencional a céu aberto como tratamento preferencial para essa condição letal. Esta é uma atualização da revisão publicada pela primeira vez em 2006.
Avaliar as vantagens e desvantagens do reparo endovascular de aneurisma de emergência (eEVAR) comparado ao reparo cirúrgico convencional a céu aberto para o tratamento do aneurisma de aorta abdominal roto (AAAR). Comparamos os seguintes desfechos nos dois grupos de tratamento: mortalidade no curto prazo, taxa de complicações maiores, exclusão do aneurisma (vazamentos no grupo eEVAR), e complicações tardias.
Para esta atualização, o especialista em informações do grupo Cochrane Vascular fez buscas no Cochrane Vascular Specialised Register (última pesquisa em junho de 2016), CENTRAL (2016, Issue 5) e plataformas de registros de ensaios clínicos. Também verificamos as listas de referências de publicações relevantes.
Incluímos ensaios clínicos controlados e randomizados (ECRs) que randomizaram participantes com diagnostico clínico ou radiológico de AAAR para eEVAR ou reparo cirúrgico convencional a céu aberto.
Dois autores de revisão, trabalhando de forma independente, avaliaram a elegibilidade dos estudos identificados pela busca, realizaram a extração dos dados e avaliaram a qualidade dos estudos. As discordâncias foram resolvidas mediante discussão. Realizamos metanálises utilizando o modelo de efeitos fixos. Calculamos as razões de chances (ORs) para os dados dicotômicos e calculamos as diferenças médias para os dados contínuos. Em ambos os casos, calculamos os intervalos de confiança (IC) de 95%.
Incluímos na revisão quatro ECRs. Esses estudos randomizaram 868 participantes com diagnóstico clínico ou radiológico de AAAR para eEVAR ou cirurgia convencional a céu aberto. No geral, o risco de viés foi baixo. Porém, um estudo teve alto risco de viés de seleção porque os investigadores usaram randomização em blocos por semana, e não realizaram sigilo de alocação ou cegamento. Outro estudo não relatou adequadamente a geração da sequência de randomização, colocando-o em risco de viés de seleção, e dois estudos tiveram baixo poder estatístico. Não encontramos evidência clara de diferença entre as duas intervenções para mortalidade nos primeiros 30 dias (ou durante a internação): OR 0,88, IC 95% 0,66 a 1,16, evidência de qualidade moderada. Houve um total de 44 eventos de vazamento em 128 participantes de três estudos (evidência de baixa qualidade). Um até três estudos apresentaram desfechos de complicações nos primeiros 30 dias (infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral, complicações cardíacas compostas, complicações renais, isquemia intestinal grave, isquemia medular, reoperação, amputação e insuficiência respiratória). Isso impediu conclusões robustas para esse desfecho. Rebaixamos a qualidade da evidência para infarto do miocárdio, complicações renais, e insuficiência respiratória devido à imprecisão, inconsistência e ao risco de viés. Para infarto do miocárdio o OR foi 2,38, IC 95% 0,34 a 16,53 (139 participantes, 2 estudos, evidência de baixa qualidade). Para complicações renais, o OR foi 1,07, IC 95% 0,21 a 5,42 (255 participantes, 3 estudos, evidência de baixa qualidade). Para insuficiência respiratória, o OR foi 3,62, IC 95% 0,14 a 95,78 (32 participantes, 1 estudo, evidência de baixa qualidade). Existe evidência de baixa qualidade de redução da isquemia intestinal no grupo submetido à eEVAR (OR 0,37, IC 95% 0,14 a 0,94). Porém o número de eventos foi muito baixo, e rebaixamos a qualidade da evidência devido à imprecisão e ao risco de viés. Três estudos avaliaram desfechos após seis meses e um ano do tratamento. Porém, pudemos usar os dados de apenas um estudo para cada desfecho. Esses dados não mostraram evidência clara de diferença entre as intervenções. A qualidade da evidência para mortalidade em seis meses foi moderada devido à imprecisão (OR 0,89, IC 95% 0,40 a 1,98, 116 participantes).
Tradução do Centro Afiliado Paraíba, Cochrane Brazil (David Cesarino de Sousa e Maria Regina Torloni). Contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br