Controle glicêmico rigoroso comparado ao controle habitual para prevenir a infecção da ferida operatória em adultos

A infecção da ferida operatória (“infecção de sítio cirúrgico” ou ISC) leva os pacientes operados a terem piores desfechos. Estudos anteriores têm sugerido que baixar os níveis de açúcar no sangue (glicemia) para valores dentro de uma faixa estreita (controle rigoroso), no período que cerca a cirurgia, talvez possa reduzir as infecções e melhorar os desfechos das pessoas operadas. No entanto, essa estratégia não vem se disseminando amplamente devido a preocupações com os efeitos colaterais de se manter os níveis glicêmicos mais baixos, como convulsões e maior risco de morrer. Encontramos apenas cinco estudos comparando estratégias de controle rigoroso da glicemia versus tratar os pacientes apenas quando eles têm níveis de glicemia elevados. Esses estudos tinham bastante diferenças nas características dos pacientes, metas glicêmicas (valor no qual se almeja manter a glicemia), remédios e métodos utilizados para redução da glicemia, assim como nos desfechos avaliados. Além disso, cada estudo individual era pequeno e/ou tinha falhas, e não demonstrou redução significante de infecções da ferida operatória. Portanto, os dados são insuficientes para apoiar o controle glicêmico rigoroso de rotina, para todos pacientes no período ao redor da cirurgia, para prevenir as infecções da ferida operatória.

Conclusão dos autores: 

A evidência é insuficiente para apoiar o controle glicêmico rigoroso, em vez do controle convencional (manter glicemia abaixo de 200 mg/dL), para a prevenção da ISC. Não encontramos estudos que avaliassem o controle glicêmico rigoroso no período pré-operatório imediato ou fora de uma unidade de terapia intensiva. Os estudos foram limitados devido ao pequeno tamanho amostral, às inconsistências nas definições das medidas de desfechos e à qualidade metodológica. Mais estudos randomizados de grande porte são necessários para tratar dessa questão, podendo ser mais apropriados se conduzidos em pacientes com alto risco para ISC.

Leia o resumo na íntegra...
Introdução: 

As infecções de sítio cirúrgico (ISC) estão associadas com morbidade e mortalidade significativas, além de aumento de custos e uso de recursos. No entanto, as ISC são potencialmente evitáveis. A hiperglicemia no período perioperatório está associada com aumento dos quadros de ISC e as recomendações são no sentido de tratar pacientes com níveis glicêmicos acima de 200 mg/dl. Entretanto, estudos recentes têm questionado qual seria o controle glicêmico ideal para prevenir as ISC. Permanece controverso se os benefícios do controle glicêmico rigoroso com insulina, comparados com o manejo convencional, sobrepõem os riscos inerentes a essa prática.

Objetivos: 

Resumir as evidências do impacto do controle glicêmico no período perioperatório sobre a incidência de infecções de sítio cirúrgico, hipoglicemia, nível de controle glicêmico, mortalidade por todas as causas e mortalidade relacionada à infecção, e tempo de internação, além de investigar as diferenças de efeitos entre os diversos níveis de controle glicêmico.

Métodos de busca: 

A busca foi feita nas seguintes bases de dados: Cochrane Wounds Group Specialised Register (desde 25 de março de 2009), The Cochrane Central Register of Controlled Trials, The Cochrane Library 2009, Issue 1; Ovid MEDLINE (de 1950 até a segunda semana de março de 1950); Ovid EMBASE (de 1980 até a 12a semana de 2009) e EBSCO CINAHL (de 1982 até março de 2009). A busca não teve restrições de idioma ou status da publicação.

Critério de seleção: 

Incluímos ensaios clínicos randomizados (ECR) que avaliavam dois (ou mais) esquemas de controle glicêmico no período perioperatório (até uma semana de pré, intra e/ou pós-operatório) e relatavam infecção de sítio cirúrgico como um dos seus desfechos.

Coleta dos dados e análises: 

Usamos a metodologia padrão para condução de revisões sistemáticas de acordo com o Cochrane Wounds Group. Dois autores, trabalhando de forma independente, avaliaram os resultados das buscas e identificaram os estudos relevantes. Dois revisores extraíram os dados e os desfechos de cada estudo e avaliaram a qualidade metodológica de cada um deles. As discordâncias foram resolvidas por discussão ou referidas para um terceiro revisor.

Principais resultados: 

Cinco ECRs preencheram os critérios de inclusão preestabelecidos para esta revisão. Nenhum estudo avaliou o controle glicêmico rigoroso no período pré-operatório imediato ou fora da unidade de terapia intensiva. Não foi possível combinar os resultados dos cinco estudos em metanálises, devido à heterogeneidade dos participantes, do período perioperatório, das metas glicêmicas, das vias de administração de insulina e das definições dos desfechos. A qualidade metodológica dos estudos foi variável. Apenas um estudo relatou uma redução significativa da ISC com o controle rigoroso da glicemia. Porém, foi difícil avaliar a qualidade metodológica desse estudo devido à descrição inadequada de como ele foi conduzido. Além disso, a taxa basal de ISC foi alta (30%) nesse estudo. Os outros estudos não tiveram poder para detectar uma diferença na ISC devido à taxa basal de ISC baixa (menor ou igual a 5%) ou por não relataram a ISC como desfecho isolado, mas como parte de um desfecho composto. Os três estudos que avaliaram hipoglicemia (usando diversas definições), relataram maior incidência desse desfecho no grupo com controle glicêmico rigoroso. Porém, nenhum dos estudos atribuiu morbidade significativa à hipoglicemia. O controle glicêmico adequado entre os grupos foi medido diferentemente nos diversos estudos. Os estudos não puderam ser comparados devido às diferenças nas suas metas glicêmicas e estiveram suscetíveis a vieses de mensuração devido às diferenças nas frequências das medidas e na falta de cegamento dos profissionais responsáveis pela aplicação dos esquemas de controle glicêmico. Nenhum estudo avaliou mortalidade relacionada à infecção. Nenhum estudo relatou uma diferença significativa na mortalidade por todas as causas. Apenas um estudo relatou um período de internação significativamente menor no grupo de controle glicêmico rigoroso.

Notas de tradução: 

Tradução do Centro Cochrane do Brasil - Centro Afiliado João Pessoa (André Telis de Vilela). Contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br

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