Qual a acurácia da ressonância magnética para o diagnóstico precoce da demência devido à doença de Alzheimer em pessoas com comprometimento cognitivo leve?

Por que é importante melhorar o diagnóstico da doença de Alzheimer?

Comprometimento cognitivo é quando as pessoas têm problemas para lembrar, aprender, concentrar-se e tomar decisões. As pessoas com comprometimento cognitivo leve (CCL) geralmente têm mais problemas de memória do que outras pessoas da sua idade, mas esses problemas não são suficientemente graves para serem classificados como demência. Estudos indicam que as pessoas com CCL e perda de memória têm maior probabilidade de desenvolver demência por doença de Alzheimer (aproximadamente 10% a 15% dos casos por ano) do que pessoas sem CCL (1% a 2% por ano). Atualmente, a única maneira confiável de diagnosticar a demência por doença de Alzheimer é realizar seguimento das pessoas com CCL e avaliar as mudanças cognitivas ao longo dos anos. A ressonância magnética (RM) pode detectar alterações nas estruturas cerebrais que indicam o início da doença de Alzheimer. O diagnóstico precoce do CCL devido à doença de Alzheimer é importante porque as pessoas com CCL podem se beneficiar de um tratamento precoce para prevenir ou retardar o declínio cognitivo.

Qual foi o objetivo desta revisão?

Avaliar a acurácia diagnóstica da RM para o diagnóstico precoce da demência devido à doença de Alzheimer em pessoas com CCL.

O que foi estudado nesta revisão?

O volume de várias regiões cerebrais foi medido por RM. A maioria dos estudos (22 estudos, 2209 participantes) mediu o volume do hipocampo, uma região do cérebro que está associada principalmente à memória.

Quais são os principais resultados desta revisão?

Trinta e três estudos foram elegíveis, nos quais 3935 participantes com CCL foram incluídos e acompanhados por dois ou três anos para avaliar se desenvolveram demência por doença de Alzheimer. Cerca de um terço deles desenvolveram demência por doença de Alzheimer, e os outros não a desenvolveram ou desenvolveram outros tipos de demência.

Descobrimos que a RM não é precisa o suficiente para identificar pessoas com CCL que desenvolverão demência por doença de Alzheimer. A cada 300 pessoas com CCL, a RM deixaria de prever a doença de Alzheimer em 81 delas (falsos negativos). Além disso, a RM faria uma previsão errada da doença de Alzheimer em 203 pessoas a cada 700 pessoas com CCL (falsos positivos). Como resultado, as pessoas com um diagnóstico falso negativo ficariam falsamente tranquilizadas e não se preparariam para lidar com a doença de Alzheimer, enquanto as pessoas com um diagnóstico falso positivo sofreriam com o diagnóstico errado.

Quão confiáveis são os resultados dos estudos?

Os estudos usaram critérios clínicos padronizados para diagnosticar demência por Alzheimer nos participantes no seguimento de dois ou três anos. Tivemos algumas reservas sobre como os estudos foram conduzidos, uma vez que os participantes foram selecionados principalmente a partir de registros clínicos e centros de referência. Tivemos também reservas sobre como os estudos interpretaram as ressonâncias magnéticas. Além disso, os estudos foram conduzidos de forma diferente uns dos outros, e usaram métodos diferentes para selecionar pessoas com CCL e realizar a RM.

A quem se aplicam os resultados desta revisão?

Os resultados não se aplicam a pessoas com CCL na comunidade, mas apenas a pessoas com CCL que frequentam clínicas de memória ou centros de referência.

Quais são as implicações desta revisão?

A RM, como exame único, não é precisa (tem pouca acurácia) para o diagnóstico precoce de demência por doença de Alzheimer em pessoas com CCL, uma vez que um em cada três ou quatro participantes recebeu um diagnóstico errado de doença de Alzheimer. Pesquisas futuras não devem se concentrar num único teste (como a RM), mas sim em combinações de testes para melhorar o diagnóstico precoce da demência por doença de Alzheimer.

Quão atualizada é esta revisão?

A revisão incluiu estudos publicados até 29 de janeiro de 2019.

Conclusão dos autores: 

O volume do hipocampo ou lobo temporal medial, as regiões cerebrais mais estudadas, mostrou baixa sensibilidade e especificidade e não qualificou a RM estrutural como um exame complementar independente para diagnóstico precoce de demência devido à doença de Alzheimer em pessoas com CCL. Isso é consistente com as diretrizes internacionais, que recomendam o exame de imagem para excluir causas não degenerativas ou cirúrgicas de comprometimento cognitivo e não para diagnosticar demência devido à doença de Alzheimer. Devido à baixa qualidade metodológica da maioria dos estudos incluídos, os achados desta revisão devem ser interpretados com cautela. Pesquisas futuras não devem se concentrar em um único biomarcador, mas sim em combinações de biomarcadores para melhorar o diagnóstico precoce da demência por doença de Alzheimer.

Leia o resumo na íntegra...
Introdução: 

O comprometimento cognitivo leve (CCL) devido à doença de Alzheimer é a fase de pré-demência sintomática da demência por doença de Alzheimer. O CCL se caracteriza por deficiência cognitiva e funcional não suficientemente graves para preencher os critérios para demência. Em amostras clínicas, pessoas com CCL amnéstico têm alto risco de desenvolver demência por doença de Alzheimer, com taxas anuais de progressão de CCL para doença de Alzheimer estimadas em aproximadamente 10% a 15% em comparação com as taxas de incidência básica de demência por doença de Alzheimer, que são de 1% a 2% ao ano.

Objetivos: 

Avaliar a acurácia diagnóstica da ressonância magnética estrutural (RM) para o diagnóstico precoce da demência por doença de Alzheimer em pessoas com CCL versus o padrão-ouro de diagnóstico clínico de doença de Alzheimer feito no acompanhamento dos pacientes (verificação tardia).

Investigar fontes de heterogeneidade na acurácia, como avaliação visual qualitativa ou medições volumétricas quantitativas, incluindo técnicas de RM manuais ou automáticas, ou a duração do seguimento, e a idade dos participantes.

A RM foi avaliada como um exame complementar ao diagnóstico clínico de CCL para melhorar o diagnóstico precoce da demência devido à doença de Alzheimer em pessoas com CCL.

Métodos de busca: 

No dia 29 de janeiro de 2019, fizemos buscas nas seguintes bases de dados: Cochrane Dementia and Cognitive Improvement Specialised Register, MEDLINE, Embase, BIOSIS Previews, Science Citation Index, PsycINFO, e LILACS. Também pesquisamos as listas de referências de todos os estudos elegíveis identificados pelas buscas eletrônicas.

Critério de seleção: 

Incluímos estudos coorte de qualquer tamanho que incluíssem pessoas de qualquer idade com diagnóstico de CCL recrutadas prospectivamente. Incluímos estudos que compararam a acurácia diagnóstica da RM estrutural basal versus o diagnóstico clínico de demência por doença de Alzheimer durante o seguimento clínico (verificação tardia). Não excluímos estudos com base no tempo de seguimento. Incluímos estudos que utilizaram tanto avaliação visual qualitativa quanto medidas volumétricas quantitativas de RM para detectar atrofia em todo o cérebro ou em regiões específicas, como hipocampo, lobo temporal medial, ventrículos laterais, córtex entorrinal, giro temporal medial, lobo temporal lateral, amígdala e substância cinzenta cortical.

Coleta dos dados e análises: 

Quatro equipes, cada uma com dois autores da revisão, avaliaram, independentemente, os títulos e resumos dos artigos identificados pela estratégia de busca. Duas equipes, cada uma com dois autores da revisão, avaliaram, independentemente, o texto completo dos artigos selecionados para elegibilidade, extraíram os dados, e resolveram as discordâncias por consenso. Dois autores da revisão avaliaram independentemente a qualidade dos estudos utilizando a ferramenta QUADAS-2. Utilizamos um modelo hierárquico de curva característica de operação do receptor (HSROC) para adequar as curvas SROC e para obter medidas gerais de acurácia relativa nas análises de subgrupos. Também utilizamos esses modelos para obter estimativas agrupadas de sensibilidade e especificidade quando conjuntos suficientes de dados estavam disponíveis.

Principais resultados: 

Incluímos 33 estudos, publicados de 1999 a 2019, com 3935 participantes, dos quais 1341 (34%) progrediram para demência por doença de Alzheimer e 2594 (66%) não progrediram. Dos participantes que não progrediram para a demência por doença de Alzheimer, 2.561 (99%) permaneceram com CCL estável e 33 (1%) progrediram para outros tipos de demência. A proporção mediana de mulheres foi de 53% e a idade média dos participantes variou de 63 a 87 anos (mediana de 73 anos). A duração média do seguimento clínico variou de 1 a 7,6 anos (mediana de 2 anos). A maioria dos estudos foi de baixa qualidade metodológica devido ao risco de viés para a seleção dos participantes ou teste índice, ou ambos.

A maioria dos estudos incluídos relatou dados sobre o volume total do hipocampo: sensibilidade média agrupada 0,73 (intervalo de confiança (IC) 95% 0,64 a 0,80); especificidade média agrupada 0,71 (IC 95% 0,65 a 0,77); 22 estudos, 2209 participantes. Essa evidência foi de qualidade baixa devido ao risco de viés e inconsistência.

Sete estudos relataram dados sobre a atrofia do lobo temporal medial: sensibilidade média 0,64 (IC 95% 0,53 a 0,73); especificidade média 0,65 (IC 95% 0,51 a 0,76); 1077 participantes. Cinco estudos relataram dados sobre o volume dos ventrículos laterais: sensibilidade média 0,57 (IC 95% 0,49 a 0,65); especificidade média 0,64 (IC 95% 0,59 a 0,70); 1077 participantes. Essa evidência foi de qualidade moderada devido ao risco de viés.

Quatro estudos, com 529 participantes, analisaram o volume do córtex entorrinal, e quatro estudos, com 424 participantes, analisaram o volume de todo o cérebro. Não estimamos a sensibilidade e especificidade agrupadas para o volume dessas duas regiões porque os dados disponíveis eram esparsos e heterogêneos.

Não foi possível avaliar estatisticamente os volumes do lobo temporal lateral, da amígdala, do giro temporal medial, nem da substância cinzenta cortical avaliados em pequenos estudos individuais.

Não encontramos evidência de diferença entre os estudos na acurácia do volume hipocampal total em relação à duração do seguimento ou idade dos participantes, mas a técnica de RM manual foi superior às técnicas automáticas em comparações mistas (na maioria das vezes indiretas). Não avaliamos a acurácia relativa dos volumes das diferentes regiões cerebrais medidas pela RM porque apenas comparações indiretas estavam disponíveis, os estudos eram heterogêneos, e a acurácia geral de todas as regiões era moderada.

Notas de tradução: 

Tradução do Centro Afiliado Paraíba, Cochrane Brasil (Ana Beatriz Venâncio de Paula Bezerra e David Cesarino de Sousa). Contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br

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