Dar quantidades diárias pequenas e crescentes de proteína do ovo ajuda as pessoas com alergia ao ovo?

Introdução

Até recentemente, a única opção prática para as pessoas com alergias alimentares era evitar completamente a ingestão desses alimentos. É difícil evitar o ovo porque ele é encontrado em muitos alimentos. Até as pessoas mais cuidadosas e que procuram seguir rigorosamente essa restrição têm medo de ingerir acidentalmente alimentos com ovo devido às falhas dos rótulos dos alimentos ou contaminação cruzada. As pessoas alérgicas a ovos que ingerem acidentalmente alimentos que contêm essa proteína podem ter eventos adversos graves, com risco de morte.

A imunoterapia oral, também conhecida como dessensibilização oral ou vacinação, é um novo tipo de tratamento para alergia ao ovo. O tratamento envolve o consumo diário de uma pequena quantidade de proteína do ovo, que é gradualmente aumentada ao longo do tempo até se atingir uma dose completa do alimento. Este método pode alterar a resposta alérgica à proteína do ovo pelo sistema imunológico do organismo, aumentando a quantidade de ovo que a pessoa pode consumir sem ter reações adversas.

Data da busca

Para esta atualização da revisão, fizemos buscas por todos estudos publicados até março de 2017.

Características do estudo

Incluímos 10 estudos controlados randomizados (estudos que sorteiam as pessoas para os grupos de tratamento). Esses estudos incluíram pessoas com alergia a ovo e compararam a imunoterapia oral versus placebo (um tratamento falso que não contém ovo) ou uma dieta sem ovo. Os 10 estudos incluíram um total de 439 crianças com idades entre 1 e 18 anos. Nos estudos, 249 crianças foram sorteadas para o grupo de imunoterapia oral (tratamento com ovo) e 190 para o grupo controle (sem ovo).

Principais resultados

A evidência mostrou que dar uma quantidade pequena e crescente de ovo pode ajudar a maioria das crianças com alergia a tolerar uma porção parcial deste alimento, desde que continuem a consumir uma quantidade diária desta proteína. Os efeitos colaterais foram frequentes durante a imunoterapia oral, mas foram geralmente leves a moderados. Porém, 21 das 249 crianças tratadas com imunoterapia oral para alergia ao ovo necessitaram de medicamentos devido a uma reação grave. Os estudos não relataram informações sobre a qualidade de vida das crianças e suas famílias durante o tratamento de imunoterapia oral.

Qualidade da evidência

Os estudos tinham poucos participantes e problemas na sua condução. Portanto, mais pesquisas são necessárias.

Conclusão dos autores: 

A exposição frequente e crescente ao ovo durante um a dois anos pode criar tolerância em pessoas alérgicas a esse alimento. A maioria das pessoas que se tornaram tolerantes estava no grupo ativo. Quase metade das pessoas do grupo tratado se tornaram totalmente tolerantes ao ovo no final do tratamento, comparado a 10% daquelas que evitaram o ovo. Porém, quase todos os participantes do grupo de tratamento tiveram eventos adversos, principalmente relacionados com alergias. Uma em cada 12 crianças teve reações alérgicas graves que exigiram o uso de adrenalina, e algumas pessoas desistiram da imunoterapia oral. Os resultados sugerem que a imunoterapia oral para a alergia ao ovo é efetiva. Porém, devido ao pequeno número de estudos, com poucos participantes, e a problemas metodológicos em alguns estudos, a qualidade da evidência (confiança) entre benefícios e danos é baixa.

Leia o resumo na íntegra...
Introdução: 

A alergia clínica a ovos é uma alergia alimentar comum. O manejo atual desses casos se baseia na prevenção rigorosa da exposição do paciente ao alergênio. A imunoterapia oral pode ser uma alternativa. Esse tratamento consiste na dessensibilização ao alergênio do ovo.

Objetivos: 

Avaliar a eficácia e segurança da imunoterapia oral e sublingual em crianças e adultos com alergia ao ovo mediada por imunoglobulina E (IgE) em comparação com placebo ou uma estratégia de prevenção.

Métodos de busca: 

Em 31 de março de 2017 fizemos buscas em 13 bases de dados usando uma combinação de descritores de saúde e palavras de texto. Procuramos por artigos publicados em periódicos, textos em anais de congressos, teses, e estudos em andamento em plataformas de registros de ensaios clínicos.

Critério de seleção: 

Incluímos ensaios controlados randomizados (ECRs) que compararam imunoterapia oral ou sublingual usando qualquer protocolo versus placebo ou dieta sem ovo. Os participantes eram crianças ou adultos com alergia clínica ao ovo.

Coleta dos dados e análises: 

As buscas eletrônicas identificaram 97 estudos. Os autores da revisão selecionaram os estudos, extraíram os dados e avaliaram a qualidade metodológica dos ECRs. Sempre que possível, tentamos entrar em contato com os autores dos estudos para obter dados não publicados. Utilizamos a estatística I² para avaliar a heterogeneidade estatística. Calculamos a razão de risco combinada (RR) e seu intervalo de confiança (IC) de 95% para cada desfecho usando o modelo de efeito fixo de Mantel-Haenzel se a heterogeneidade estatística fosse baixa (I² menor que 50%). Usamos o GRADE para avaliar a qualidade da evidência dos desfechos.

Principais resultados: 

Incluímos 10 ECRs que preencheram nossos critérios de inclusão. Esses estudos envolveram um total de 439 crianças (249 com imunoterapia oral e 190 no grupo controle). A idade dos participantes variou de 1 a 18 anos. Cada estudo utilizou um protocolo de imunoterapia oral diferente; nenhum deles utilizou imunoterapia sublingual. Os grupos controle foram dieta sem ovo (7 estudos) e placebo (3 estudos). Os desfechos primários foram: aumento da quantidade de ovos que pôde ser ingerida e tolerada sem eventos adversos enquanto o participante recebia imunoterapia oral específica para alergênios ou imunoterapia sublingual, em comparação com o controle; e desaparecimento completo da alergia ao ovo após o término da imunoterapia oral ou sublingual, em comparação com o controle. A maioria das crianças (82%) do grupo imunoterapia oral conseguiu tolerar a ingestão de uma dose parcial de ovo (1 g a 7,5 g) comparado a 10% das crianças do grupo controle (RR 7,48, IC 95% 4,91 a 11,38; RD 0,73, IC 95% 0,67 a 0,80). Menos da metade (45%) das crianças que receberam imunoterapia oral foram capazes de tolerar uma dose completa de ovo comparado a 10% das crianças do grupo controle (RR 4,25, IC 95% 2,77 a 6,53; RD 0,35,IC 95% 0,28 a 0,43). Todos os 10 estudos relataram o número de crianças com eventos adversos graves (EAGs) ou eventos adversos leves a graves. Ocorreram 8,4% (21/249) EAGs com necessidade de epinefrina/adrenalina no grupo da imunoterapia oral comparado a 0% no grupo controle. Houve muitos casos de eventos adversos leves a graves. No grupo da imunoterapia oral, 75% das crianças apresentaram eventos adversos leves a graves versus 6,8% no grupo controle (RR 8,35, IC 95% 5,31 a 13,12). É importante salientar que, em 7 estudos, o grupo controle foi dieta sem ovos. O fato de 4,2% dessas crianças terem desenvolvido eventos adversos pode ser decorrente da ingestão acidental de alimentos contendo ovos. Os três estudos que usaram placebo como controle relataram uma taxa de eventos adversos de 2,6% nesse grupo. No geral, o rigor metodológico dos estudos foi inconsistente. Todos os estudos tinham um pequeno tamanho amostral e utilizaram diferentes protocolos para imunoterapia oral. Oito ECRs tinham alto risco de viés em pelo menos um domínio. A qualidade da evidência foi baixa. O rebaixamento da qualidade foi decorrente do pequeno número de participantes e eventos, e possíveis vieses.

Notas de tradução: 

Tradução do Centro Cochrane do Brasil (Isabela Hercilia Costa e Aline Rocha). Contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br

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