Qual é a questão?
Queríamos avaliar a eficácia dos tratamentos orais (ingestão de medicamentos, ervas ou alimentos) para aumentar a produção de leite de mães de bebês saudáveis nascidos a termo (com nove meses). A falta de leite é muitas vezes apontada como razão para a suplementação e o desmame precoces, antes do que seria desejado. Diversos fatores, como a saúde da mãe e do bebê, a capacidade do bebê sugar, a pega adequada e a frequência das mamadas, podem afetar a produção do leite materno. Antes de usar um galactagogo, é recomendável fazer tudo que for possível para identificar e corrigir as causas da baixa produção de leite.
Por que isso é importante?
A produção inadequada de leite pode deixar as mães aflitas e ameaçar a saúde dos bebês. Em muitos casos, a escolha do galactagogo é influenciada pela familiaridade com o método ou por costumes locais. Algumas mães podem preferir tomar remédios enquanto outras preferem produtos naturais. A evidência dos possíveis benefícios e danos dos galactagogos é importante para ajudar as mães a tomarem decisões informadas.
Que evidências encontramos?
Buscamos evidências provenientes de ensaios clínicos randomizados (um tipo de estudo) que houvessem sido publicados até 4 de novembro de 2019. Encontramos 41 estudos elegíveis, realizados em pelo menos 17 países. Esses estudos incluíram 3005 mães e 3006 bebês. Houve bastante variação entre os estudos quanto à idade dos bebês, o tipo e o tempo de uso dos galactagogos, e como os resultados foram relatados. Os medicamentos avaliados nesses estudos foram a sulpirida, a metoclopramida, a domperidona e o hormônio liberador da tireotropina. As intervenções naturais avaliadas nesses estudos foram a ingestão de flor de banana, erva doce, feno-grego, gengibre, ixbut, algodão de levant, moringa, tâmaras, nozes de porco, shatavari, silimarina, folhas de torbangun e diversas misturas naturais na forma de chás ou sopas.
Medicamentos para aumentar a produção de leite
Nove estudos compararam o uso de um medicamento versus placebo ou nenhum tratamento. Nenhum dos estudos apresentou a taxa de amamentação exclusiva aos 3, 4 ou 6 meses. Somente um estudo (metoclopramida, 20 participantes) avaliou o ganho de peso em bebês amamentados exclusivamente no peito e encontrou melhores resultados no grupo que tomou galactagogos. Três estudos (151 participantes) avaliaram o volume de leite com o uso de domperidona, metoclopramida ou sulpirida. Os autores relataram mais leite nos grupos que usaram os medicamentos. Porém, a qualidade da evidência foi baixa. Poucos estudos avaliaram os efeitos adversos dos medicamentos. Os estudos que avaliaram esses efeitos relataram apenas queixas menores, como cansaço, náuseas, diminuição do apetite, dor de cabeça e boca seca.
Galactagogos naturais
Encontramos 27 estudos que testaram galactagogos naturais versus placebo ou nenhum tratamento. Apenas um desses estudos (60 participantes) avaliou o uso da intervenção (chá de Leite Materno) sobre as taxas de amamentação. Os autores relatam não haver "nenhuma diferença significativa aos 6 meses" mas não apresentaram quaisquer dados (evidência de qualidade muito baixa). Três estudos (275 participantes) avaliaram mudanças no peso das crianças. Dois estudos (moringa, chá botânico misto) relataram maior ganho de peso no grupo que recebeu galactagogos. O terceiro estudo (erva doce e feno-grego) foi inconclusivo, isto é, não conseguiu descobrir se houve maior ganho de peso com o uso dos galactagogos. Encontramos 13 estudos (envolvendo 962 participantes) que testaram o efeito de diversas substâncias (Bu Xue Sheng Ru, Chan Bao, Cui Ru, flor de bananeira, feno-grego, gengibre, moringa, gengibre e curcuma, ixbut, chá botânico misto, Sheng Ru He Ji, silimarina, Xian Tong Ru, tâmaras) sobre o volume do leite materno. Alguns desses estudos encontraram benefícios dessas intervenções enquanto outros estudos encontraram pouco ou nenhum efeito. Por isso estamos muito incertos sobre os efeitos dessas intervenções sobre o volume de leite. Poucos estudos avaliaram os efeitos adversos dos medicamentos. Os poucos estudos que fizeram essa avaliação relataram queixas menores, como mães com urina com cheiro a xarope de bordo e erupção cutânea nos bebês (evidência de qualidade muito baixa).
Comparação entre diferentes galactagogos
Oito estudos (Chanbao, Bue Xue Sheng Ru, domperidona, moringa, fenugreek, tâmaras, torbangun, moloco, Mu Er Wu You, Kun Yuan Tong Ru) compararam diferentes galactagogos entre si. Não podemos ter certeza se um galactagogo é melhor do que outro pois encontramos apenas um pequeno estudo para cada comparação.
O que isso significa?
Existe pouca evidência que os galactagogos farmacológicos aumentem o volume de leite. Também existe pouca evidência que os galactagogos naturais aumentem o volume de leite e o peso dos bebês. Porém, estamos muito incertos sobre essas evidências. Devido à falta de dados, também não temos certeza quanto aos riscos para a mãe ou para o bebê decorrentes da tomada de qualquer galactagogo. Mais estudos de alta qualidade são necessários para aumentar nossa certeza sobre os efeitos dos galactagogos.
Devido à escassa evidência de qualidade muito baixa, não sabemos se os galactagogos têm algum efeito sobre a proporção de mães que continuam a amamentar aos 3, 4 e 6 meses. Existe evidência de baixa qualidade que os galactagogos farmacológicos podem aumentar o volume de leite. Existe alguma evidência proveniente de análises de subgrupos que os galactagogos naturais podem aumentar o peso dos bebês e o volume de leite em mães com bebês saudáveis, a termo. Porém, devido à grande heterogeneidade entre os estudos, imprecisão das medições e relatos incompletos, estamos muito incertos sobre a magnitude desse efeito. Também não sabemos se um galactagogo seria melhor que outro. Devido à escassez de dados, não sabemos se existem efeitos adversos com algum galactagogo específico. Os efeitos adversos relatados foram queixas menores.
Existe uma necessidade urgente de realizar ECRs de alta qualidade sobre a eficácia e segurança dos galactagogos. Também é necessário criar um conjunto de desfechos essenciais para padronizar a medição do peso e o volume de leite. Também é importante padronizar a dosagem e a forma de uso dos galactagogos.
Muitas mulheres se preocupam com sua capacidade de produzir leite suficiente. A falta de leite é frequentemente citada como a razão para a suplementação e o desmame precoce. Em mulheres preocupadas com sua produção de leite, é importante avaliar primeiro a saúde materna e neonatal, a sucção do bebê, a adequação da pega e a frequência das mamadas. Em seguida, deve-se implementar as medidas necessárias para corrigir ou compensar eventuais problemas detectados.
Os galactagogos orais são substâncias que estimulam a produção de leite. Eles podem ser substâncias medicamentosas farmacológicas ou sustâncias não farmacológicas (naturais). Os galactagogos naturais são geralmente agentes botânicos ou alimentos. A escolha entre galactagogos farmacológicos ou naturais é frequentemente influenciada pela familiaridade das mulheres com os produtos e por costumes locais. A evidência dos possíveis benefícios e danos dos galactagogos é importante para a tomada de decisão informada sobre o uso dessas substâncias.
Avaliar o efeito dos galactagogos orais sobre a produção de leite em mães de lactentes não-hospitalizados.
Fizemos buscas nas seguintes bases de dados em 4 de novembro de 2019: Cochrane Pregnancy and Childbirth Group's Trials Register, ClinicalTrials.gov, plataforma da Organização Mundial da Saúde (OMS) International Clinical Trials Registry Platform (ICTRP), Health Research and Development Network - Phillippines (HERDIN), Natural Products Alert (Napralert), na coleção de referências pessoais do autor LM, e nas listas de referências de estudos recuperados.
Incluímos ensaios randomizados controlados (ECR) e quase randomizados (incluindo resumos publicados) que compararam galactagogos orais versus placebo, nenhum tratamento, ou outro galactagogo oral em mães amamentando bebês saudáveis nascidos a termo. Também incluímos ensaios clínicos randomizados tipo cluster, mas excluímos ensaios clínicos tipo cross-over.
Utilizamos os métodos padrão do grupo de revisão Cochrane Gravidez e Parto para a coleta e análise dos dados. Dois a quatro autores da revisão, trabalhando de forma independente, selecionaram os estudos, avaliaram o risco de viés, extraíram os dados para análise e verificaram a exatidão do processo. Quando necessário, contatamos os autores dos estudos para esclarecer dúvidas.
Incluímos na revisão 41 ECRs realizados em pelo menos 17 países, envolvendo 3005 mães e 3006 bebês. Os estudos foram realizados com mulheres que estavam internadas no hospital imediatamente após o parto ou com mulheres que estavam na comunidade. Houve bastante variação nas características das mães, especialmente quanto à sua paridade e se elas tinham ou não insuficiência de lactação. Houve bastante heterogeneidade na idade dos bebês no momento da inclusão nos estudos. Os estudos incluíram desde recém-nascidos até bebês com 6 meses de vida. A qualidade geral da evidência é baixa a muito baixa devido ao alto risco de viés dos estudos (principalmente devido à falta de cegamento), à heterogeneidade clínica e estatística substancial, e imprecisão dos resultados.
Galactagogos farmacológicos
Nove estudos compararam um galactagogo farmacológico (domperidona, metoclopramida, sulpirida, hormônio libertador de tireotropina) versus placebo ou nenhum tratamento.
Esses estudos não avaliaram nosso desfecho primário que era a proporção de mães que continuavam a amamentar aos 3, 4 e 6 meses. Apenas um estudo (metoclopramida) avaliou o efeito da intervenção sobre o peso infantil. Os autores encontraram pouca ou nenhuma diferença entre os grupos (diferença média (DM) 23,0 gramas, intervalo de confiança (IC) 95% -47,71 a 93,71; 1 estudo, 20 participantes; evidência de baixa qualidade).
Três estudos (metoclopramida, domperidona, sulpirida) avaliaram o volume de leite das participantes. Existe evidência que os galactagogos farmacológicos podem aumentar o volume de leite (DM 63,82 mL, IC 95% 25,91 a 101,72; I² = 34%; 3 estudos, 151 participantes; evidência de baixa qualidade). A análise por subgrupos indica que pode haver aumento do volume de leite com cada um desses medicamentos porém os ICs são variáveis.
Poucos estudos avaliaram efeitos adversos. Não foi possível incluir esses dados em metanálises. Os poucos estudos que relataram esse desfecho avaliaram apenas queixas menores, tais como cansaço, náuseas, dores de cabeça e boca seca (evidência de qualidade muito baixa). Não foram relatados efeitos adversos para os bebês.
Galactagogos naturais
Vinte e sete estudos compararam galactagogos orais naturais (flor de banana, erva doce, feno-grego, gengibre, ixbut, levant algodão, moringa, tâmaras, knuckle de porco, shatavari, silimarina, folhas de torbangun ou outras misturas naturais) versus placebo ou nenhum tratamento.
Um estudo com 60 participantes avaliou o Chá de Leite de Mãe e declarou não ter encontrado "nenhuma diferença significativa" na taxa de amamentação aos seis meses. Porém, os autores não apresentaram dados ou qualquer informação sobre a medida de significância usada. A qualidade dessa evidência foi classificada como muito baixa.
Três estudos (erva doce, feno-grego, moringa, chá botânico misto) avaliaram mudanças no peso infantil. Porém, devido à alta heterogeneidade clínica e estatística, esses estudos não puderam ser incluídos nas metanálises (I2 = 60%, 275 participantes, evidência de qualidade muito baixa). Existe evidência de qualidade muito baixa, proveniente da análise de subgrupos, sobre os possíveis efeitos da erva doce ou o feno-grego sobre o aumento do peso do bebê. Existe evidência de qualidade muito baixa que a moringa e o chá botânico misto podem aumentar o peso do bebê em comparação com o placebo. Treze estudos com um total de 962 participantes testaram diversas subtâncias (Bu Xue Sheng Ru, Chanbao, Cui Ru, flor de bananeira, feno-grego, gengibre, moringa, feno-grego, gengibre e mistura de açafrão, ixbut, chá botânico misto, Sheng Ru He Ji, silimarina, Xian Tong Ru, tâmaras) o volume de leite. Porém, devido à alta heterogeneidade, não foi possível fazer metanálises (I2 = 99%). Segundo as análises de subgrupos, as intervenções podem trazer benefícios ou pouca ou nenhuma diferença sobre esse desfecho (evidência de qualidade muito baixa). Poucos estudos avaliaram efeitos adversos. Não foi possível incluir esses dados em metanálises. Os poucos estudos que avaliaram efeitos adversos encontraram apenas queixas menores, como mães com urina que cheirava a xarope de boldo e urticária nos bebês (evidência de qualidade muito baixa).
Galactagogo versus galactagogo
Oito estudos compararam diversos galactagogos entre si (Chanbao; Bue Xue Sheng Ru, domperidona, moringa, fenugreek, tâmaras, torbangun, moloco, Mu Er Wu You, Kun Yuan Tong Ru). Não foi possível fazer metanálises pois havia apenas um pequeno estudo para cada comparação. Portanto, não sabemos se um galactagogo é melhor do que outro para qualquer desfecho.
Tradução do Cochrane Brazil (Maria Regina Torloni). Contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br