Uso da N-acetilcisteina junto com antibióticos no tratamento do Helicobacter pylori

Pergunta da revisão

Tomar N-acetilcisteína junto com antibióticos é seguro e aumenta a chance de cura das pessoas infectadas pelo Helicobacter pylori?

Introdução

O Helicobacter pylori (H pylori) é uma bactéria que vive no estômago e pode causar diversas doenças como o câncer gástrico, úlceras e outros problemas de saúde. Cerca de metade da população mundial tem essa bactéria no seu estômago. A colonização é mais comum nos países com condições sanitárias precárias. As pessoas se infectam consumindo água contaminada.

A infecção é tratada com antibióticos e um medicamento que reduz a produção de ácido no estômago. No entanto, a taxa de resistência aos antibióticos está aumentando em todo o mundo. Isso significa que, apesar do tratamento, a taxa de cura dessa infecção está diminuindo. Novos medicamentos estão sendo testados para melhorar as taxas de cura. Um desses medicamentos é a N-acetilcisteína (NAC). A NAC é um remédio usado para ajudar a dissolver o muco nas pessoas que têm doenças respiratórias. Esse remédio pode ser tomado por via oral (pela boca) ou intravenosa (injetado em uma veia). A NAC pode destruir alguns mecanismos de sobrevivência do H pylori. Assim, esse remédio poderia aumentar a taxa de cura dessa infecção.

Características dos estudos

Incluímos na revisão oito ensaios clínicos randomizados (ECR) (um tipo de estudo) envolvendo um total de 559 pessoas com idades entre 17 e 76 anos. Incluímos toda evidência disponível até abril de 2018. Todos os estudos incluíram pacientes ambulatoriais, de diversos países, que estavam sendo atendidos em centros de endoscopia. A endoscopia é um exame que introduz dentro do estômago um tubo flexível com uma câmera. Os participantes desses estudos receberam combinações diferentes de antibióticos e doses diferentes da NAC (600 mg a 1800 mg/dia). Os estudos compararam pessoas que tomaram NAC versus pessoas que tomaram um placebo (uma pílula idêntica à NAC mas sem nenhum remédio, ou seja, uma pílula ´falsa´) ou pessoas que não receberam nada além do tratamento habitual.

Principais resultados

Não é possível afirmar com certeza se a adição da NAC aos antibióticos melhora a taxa de cura da infeção pelo H pylori, quando comparada com a adição de placebo ou não dar NAC. Qualquer possível efeito benéfico da NAC deve ser visto com cautela porque os estudos incluídos foram muito diferentes e eram de baixa qualidade, com algumas falhas metodológicas que podem ter comprometido seus resultados e, por conseguinte, os resultados desta revisão.

Não é possível afirmar com certeza se a adição da NAC está associada com maior risco de eventos adversos gastrointestinais ou alérgicos, quando comparada com a adição de placebo ou não dar NAC. Os estudos incluídos nesta revisão não relataram casos de eventos adversos tóxicos.

É necessário fazer mais ensaios clínicos randomizados bem conduzidos, bem descritos, e com coleta adequada de resultados de eficácia e segurança, especialmente para as combinações de antibióticos atualmente recomendadas.

Qualidade da evidência

A qualidade (grau de certeza) da evidência para a taxa de erradicação variou de muito baixa a baixa. Cinco estudos apresentaram informações sobre eventos adversos (efeitos colaterais). A qualidade da evidência para esse aspecto foi muito baixa. Os estudos incluídos na revisão foram mal conduzidos e isto reduziu nossa confiança nos resultados.

Conclusão dos autores: 

Não podemos afirmar com certeza que a adição da NAC aos antibióticos melhora a taxa de erradicação do H pylori, quando comparada com a adição de placebo ou não dar nenhum tratamento adicional. Recomendamos cautela na avaliação de qualquer possível efeito benéfico da NAC devido à heterogeneidade clínica, estatística e metodológica entre os estudos incluídos na revisão, e à incerteza identificada quando analisamos subgrupos de tratamento.

Não é possível afirmar com certeza se a adição da NAC está associada com maior risco de eventos adversos gastrointestinais ou alérgicos, quando comparada com a adição de placebo ou não dar NAC. Os estudos incluídos nesta revisão não relataram casos de eventos adversos tóxicos.

É necessário fazer mais ensaios clínicos randomizados, maiores, mais bem desenhados e descritos, e com coleta adequada de desfechos de eficácia e segurança, especialmente para os regimes antibióticos atualmente recomendados.

Leia o resumo na íntegra...
Introdução: 

O Helicobacter pylori (H pylori) é um dos patógenos que mais frequentemente colonizam e causam infecção nos seres humanos, afetando cerca de 50% da população mundial. A prevalência pode ser tão baixa quanto 17% na América do Norte e tão elevada quanto 83% em países da América Latina. Cerca de 20% das pessoas infectadas manifestarão a doença. As pessoas que vivem em países de média e baixa renda com condições sanitárias precárias são consideradas de alto risco para o desenvolvimento da doença, uma vez que o mecanismo de transmissão parece ser oral-oral ou fecal-oral (principalmente durante a infância). Existem vários regimes antibióticos para tratar a infecção; porém, a resistência aos antibióticos está crescendo em todo o mundo. Novas drogas adjuvantes — como probióticos, estatinas, curcumina e N-acetilcisteína (NAC) — estão sendo testadas para aumentar a taxa de erradicação.

A N-acetilcisteína pode desestabilizar a estrutura dos biofilmes, além de ter ação sinérgica com os antibióticos e efeitos bactericidas diretos. Além disso, a NAC tem propriedades antioxidantes e efeito mucolítico primário, reduzindo a espessura da camada do muco gástrico. Esses mecanismos de ação podem exercer efeitos adjuvantes benéficos na erradicação do H pylori.

Objetivos: 

Avaliar a eficácia e segurança da N-acetilcisteína como terapia adjuvante aos antibióticos para a erradicação do Helicobacter pylori.

Métodos de busca: 

Realizamos busca nas seguintes bases de dados: Cochrane Central Register of Controlled Trials (CENTRAL), MEDLINE (1966 até abril de 2018), Embase (1988 até abril de 2018), CINAHL (1982 até abril de 2018), LILACS (1982 até abril de 2018), bases de dados de literatura cinzenta e plataformas de registros de ensaios clínicos. Fizemos buscas manuais nas listas de referências dos estudos relevantes. Avaliamos os títulos e resumos de 726 artigos e selecionamos 18 como potencialmente elegíveis.

Critérios de seleção: 

Incluímos ensaios clínicos randomizados (ECR) que testaram qualquer regime de antibióticos mais NAC, em adultos infectados com H pylori. Para serem incluídos, os estudos tinham que ter um grupo controle que recebeu o mesmo regime de antibióticos mais placebo ou nenhum outro tratamento. Os desfechos de interesse foram a taxa de erradicação e a taxa de eventos adversos gastrointestinais, tóxicos e alérgicos. O relato dos desfechos primários acima mencionados não foi um critério para a inclusão dos estudos na revisão.

Coleta dos dados e análises: 

Dois revisores, trabalhando de forma independente, fizeram a seleção, a extração dos dados e a avaliação do risco de viés dos estudos. Um terceiro autor, trabalhando de forma independente, confirmou as avaliações do risco de viés dos estudos. Usamos o software Review Manager 5 para análise dos dados. Contatamos os autores dos estudos para obter informações adicionais, se necessário.

Principais resultados: 

Incluímos na revisão oito estudos envolvendo um total de 559 participantes. Os pacientes tinham entre 17 e 76 anos e estavam sendo atendidos em centros de endoscopia em diversos países. Para a maioria dos desfechos, rebaixamos a qualidade da evidência devido a má qualidade metodológica dos estudos incluídos. Os principais problemas eram questões relacionadas principalmente com a geração da sequência de alocação. sigilo de alocação e cegamento (este último domínio relacionado especificamente aos eventos adversos).

Não podemos afirmar com certeza se a adição da NAC aos antibióticos melhora a taxa de erradicação do H pylori, em comparação com a adição de placebo ou não dar nenhum tratamento adicional: 38,8% vs 49,1%, risco relativo (RR) 0,74, intervalo de confiança (IC) de 95% 0,51 a 1,08, 559 participantes, oito estudos, evidência de qualidade muito baixa. A análise de sensibilidade post-hoc (eliminando os estudos que testaram regimes antibióticos não mais recomendados na prática clínica) mostrou que a adição da NAC pode melhorar a taxa de erradicação em comparação ao controle: 27,2% vs 37,6%, RR 0,71, IC 95% 0,53 a 0,94; 397 participantes, cinco estudos.

Não é possível afirmar com certeza se a NAC, em comparação com o grupo controle, está associada com um aumento no risco de eventos adversos gastrintestinais (23,9% vs 18,9%, RR 1,25, IC 95% 0,85 a 1,85, 336 participantes, cinco estudos, evidência de qualidade muito baixa), ou eventos adversos alérgicos (2% vs 0%, RR 2,98, IC 95% 0,32 a 27,74, 336 participantes, cinco estudos, evidência de qualidade muito baixa). Os estudos incluídos não relataram eventos adversos tóxicos.

Notas de tradução: 

Tradução do Centro Cochrane do Brasil (Luis Eduardo Fontes). Contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br

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