Qual foi o objetivo desta revisão?
O objetivo desta Revisão Cochrane foi descobrir se o rastreamento odontológico escolar melhora a saúde bucal das crianças; e se isso acontecer, qual é o melhor método de rastreamento. Encontramos sete estudos relevantes para responder a esta questão. Esta é uma atualização de uma revisão que foi publicada pela primeira vez em dezembro de 2017.
Principais mensagens
Não há evidência suficiente para concluir se o rastreamento odontológico escolar tradicional aumenta as visitas ao dentista. Os programas de rastreamento odontológico escolar com cartas de encaminhamento personalizadas ou elementos de motivação adicionais provavelmente aumentam as visitas ao dentista no curto prazo (acompanhamento de três meses até dois anos). O rastreamento baseado em critérios específicos possivelmente é melhor do que a ausência de rastreamento. No entanto, não está claro se mais visitas ao dentista melhoram a saúde bucal das crianças. Ainda precisamos de estudos de alta qualidade que avaliem o impacto do rastreamento na saúde bucal e que sejam realizados por períodos de tempo mais longos.
O que foi estudado nesta revisão?
As doenças bucais, especialmente a cárie dentária, afetam crianças no mundo todo. Se não for acompanhada, a saúde bucal pode se deteriorar progressivamente e causar um impacto negativo no bem-estar geral das crianças. Há também um impacto financeiro para a família e a comunidade.
O rastreamento odontológico escolar é uma medida de saúde pública em que o exame bucal das crianças é realizado na escola e os pais são informados sobre a condição bucal e as necessidades de tratamento do seu filho. O objetivo é identificar problemas de saúde bucal numa fase precoce e estimular os pais a procurarem tratamento quando necessário. O foco desta revisão é saber se isso realmente melhora a saúde bucal das crianças.
Quais são os principais resultados desta revisão?
Encontramos sete estudos relevantes, com 20.192 crianças incluídas na análise. Quatro estudos foram realizados no Reino Unido, dois na Índia e um nos EUA. As crianças nesses estudos tinham entre 4 e 15 anos de idade. Os estudos compararam crianças que foram rastreadas na escola versus crianças que não foram rastreadas em relação à sua saúde bucal e visitas ao dentista. Os estudos também compararam um tipo versus outro tipo de rastreamento (por exemplo, variações no exame clínico ou no processo de encaminhamento).
Não temos certe\a se o rastreamento odontológico escolar tradicional aumenta as visitas ao dentista, pois a qualidade da evidência quanto a isso é muito baixa.
O rastreamento baseado em critérios específicos (por exemplo, quando a criança não visita um dentista regularmente) parece ser mais eficaz para aumentar a visita ao dentista do que a ausência de rastreamento (evidência de baixa qualidade). Porém, pode não haver diferença entre o rastreamento baseado em critérios e o rastreamento geral (evidência de qualidade muito baixa).
Uma carta de encaminhamento personalizada aos pais parece aumentar as visitas ao dentista (evidência de baixa qualidade).
O rastreamento associado com motivação em termos de educação para a saúde e oferta de tratamento gratuito, parece aumentar as visitas ao dentista (evidencia de baixa qualidade).
Existe evidência inconclusiva, proveniente de um estudo, quanto à eficácia de diferentes tipos de encaminhamentos. Esse estudo comparou uma carta de encaminhamento baseada em um modelo teórico conhecido como "modelo de autorregulação do senso comum" enviada aos pais de crianças que precisavam de tratamento, com ou sem um guia de informações sobre saúde bucal, versus uma carta de encaminhamento tradicional (evidência de qualidade muito baixa).
Todos os sete estudos acompanharam as crianças durante três a oito meses após terem sido rastreadas. Logo, não sabemos se os benefícios do rastreamento persistem ao longo do tempo.
Não encontramos estudos que abordassem a relação custo-efetividade destes programas ou quaisquer efeitos adversos.
Quão atualizada é esta revisão?
Buscamos estudos publicados até 4 de março de 2019.
Os estudos incluídos nesta revisão avaliaram os efeitos do rastreamento no curto prazo. Existe evidência de qualidade muito baixa e insuficiente para concluir se o rastreamento odontológico escolar tradicional aumenta as visitas ao dentista. Existe evidência de baixa qualidade de que o rastreamento baseado em critérios, comparado a não fazer rastreamento, pode aumentar as vistas ao dentista. Porém, não existe evidência de que essa intervenção seja superior ao rastreamento tradicional para esse mesmo desfecho (evidência de qualidade muito baixa).
Existe evidência de baixa qualidade de que as cartas de encaminhamento personalizadas ou específicas, comparado a cartas não específicas, aumentam as visitas ao dentista. Também existe evidência de baixa qualidade de que o rastreamento associado com motivação (educação em saúde bucal e oferta de tratamento gratuito) pode aumentar as visitas ao dentista, em comparação com o rastreamento isolado. Existe evidência de qualidade muito baixa e inconclusiva sobre a efetividade do envio de uma carta de encaminhamento baseada no "modelo de autorregulação do senso comum" versus uma carta de encaminhamento padrão.
Nenhum estudo avaliou possíveis efeitos adversos do rastreamento odontológico escolar ou custo-efetividade do rastreamento para a melhoria da saúde bucal.
O rastreamento odontológico escolar consiste na inspeção visual da cavidade bucal das crianças na escola, seguida da comunicação aos pais sobre o estado de saúde bucal e as necessidades de tratamento do seu filho. O rastreamento odontológico na escola pretende identificar doença na fase assintomática, estimulando assim cuidados de saúde bucal preventivos e terapêuticos para as crianças. Esta revisão avaliou a efetividade do rastreamento odontológico escolar para melhorar a saúde bucal. Esta é uma atualização de uma revisão originalmente publicada em dezembro de 2017.
Avaliar a efetividade dos programas escolares de rastreamento odontológico na saúde bucal e utilização dos serviços odontológicos.
A especialista em informação do Cochrane Oral Health Review Group pesquisou as seguintes bases de dados: Cochrane Oral Health’s Trials Register (até 4 de março de 2019), Cochrane Central Register of Controlled Trials (CENTRAL, até 4 de março de 2019), MEDLINE Ovid (de 1946 a 4 de março de 2019) e Embase Ovid (de 15 de setembro de 2016 a 4 de março de 2019). Fizemos buscas por estudos em andamento em duas plataformas de registros de ensaios clínicos: US National Institutes of Health Trials Registry (ClinicalTrials.gov) e World Health Organization International Clinical Trials Registry Platform. Não houve restrições em relação ao idioma ou status da publicação. Porém, a busca na base de dados Embase foi restrita aos últimos seis meses devido ao Cochrane Centralised Search Project para identificar todos os ensaios clínicos e adicioná-los à CENTRAL.
Incluímos ensaios controlados randomizados (ECRs) (cluster ou paralelo) que avaliaram o rastreamento odontológico escolar comparado com a ausência de intervenção ou um tipo de rastreamento comparado com outro.
Utilizamos a metodologia padrão da Cochrane.
Incluímos sete estudos (cinco eram ECRs do tipo cluster) com 20.192 crianças de 4 a 15 anos de idade. Os estudos avaliaram períodos de acompanhamento de três a oito meses. Quatro estudos foram realizados no Reino Unido, dois na Índia e um nos EUA. Dois estudos tinham baixo risco de viés, dois tinham alto risco de viés e três tinham risco de viés incerto.
Nenhum estudo teve acompanhamento de longo prazo para avaliar se os efeitos do rastreamento odontológico escolar foram duradouros.
Nenhum estudo relatou a proporção de crianças com cárie não tratada ou outras doenças bucais, custo-efetividade ou efeitos adversos.
Quatro estudos avaliaram rastreamento tradicional versus não fazer rastreamento. Realizamos uma meta-análise para o desfecho "visitas ao dentista". O resultado foi inconclusivo, com alta heterogeneidade. A heterogeneidade foi atribuída, em parte, ao desenho dos estudos (três ECRs tipo cluster e um ECR com randomização dos participantes). Rebaixamos a qualidade da evidência para ´muito baixa´ devido à inconsistência. Consequentemente, não foi possível chegarmos a nenhuma conclusão para esta comparação.
Dois ECRs do tipo cluster (ambos com quatro braços) avaliaram o rastreamento baseado em critérios versus não fazer rastreamento. A estimativa de efeito combinado foi RR 1,07 (IC 95% 0,99 a 1,16), sugerindo um possível benefício para o rastreamento (evidência de baixa qualidade). Não houve evidência de diferença na comparação entre rastreamento baseado em critérios versus rastreamento tradicional (RR 1,01, IC 95% 0,94 a 1,08) (evidência de qualidade muito baixa).
Um estudo comparou uma carta de encaminhamento específica (personalizada) versus uma cara não específica. Existe evidência de baixa qualidade de que a carta de encaminhamento específica é mais efetiva do que a carta não específica para atendimento da criança em um serviço de odontologia geral (RR 1,39, IC 95% 1,09 a 1,77) e atendimento em serviço de ortodontia especializado (RR 1,90, IC 95% 1,18 a 3,06).
Um estudo comparou rastreamento associado com motivação versus rastreamento isolado. A visita ao dentista foi mais provável no grupo do rastreamento associado com motivação: RR 3,08, IC 95% 2,57 a 3,71, evidência de baixa qualidade.
Apenas um estudo relatou a proporção de crianças com cárie dentária tratada. Este estudo avaliou uma carta de encaminhamento pós-rastreamento baseada no modelo de autorregulação do senso comum (uma estrutura teórica que explica como as pessoas entendem e respondem às ameaças à sua saúde), com ou sem um guia de informações sobre saúde bucal, versus uma carta de encaminhamento padrão. Os resultados foram inconclusivos. A qualidade da evidência foi muito baixa devido ao alto risco de viés, evidência indireta e imprecisão.
Tradução do Centro Afiliado Rio de Janeiro / Faculdade de Medicina de Petrópolis, Cochrane Brazil (Ana Paula Pires dos Santos e Maria Regina Torloni). Contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br