O não relato de um pedaço de uma pesquisa e o relato seletivo de apenas alguns de seus resultados foram identificados como problemas em estudos, como ensaios clínicos randomizados (ECRs) e revisões sistemáticas de ECRs. Se a decisão sobre o que relatar ou não relatar for baseada nos resultados obtidos no estudo, as conclusões dos leitores a respeito destes relatos serão tendenciosas e potencialmente enganosas. Uma maneira de ver se pode haver discrepâncias entre o que foi planejado ou feito em um estudo e o que finalmente foi relatado é comparar o protocolo ou o registro do estudo com o conteúdo de seu relato publicado. Isto pode revelar que foram feitas mudanças entre o registro ou protocolo do estudo e sua análise final. Para assegurar aos leitores que o risco de viés do estudo foi baixo, qualquer mudança desse tipo deve ser descrita no relato publicado.
Esta revisão metodológica da Cochrane avaliou o relato de ECRs. Para isto, revisamos os estudos que compararam as informações dos protocolos ou registro dos ECRs com os relatos publicados, para ver se estes estudos detectaram alguma inconsistência em quaisquer aspectos dos estudos. Incluímos 16 estudos nesta revisão. Os resultados destes estudos indicam que freqüentemente existem discrepâncias entre as informações fornecidas nos protocolos e nos registros dos estudos e as contidas nos relatos publicados dos ECRs. Estas discrepâncias se referem a muitos aspectos dos estudos e não são explicadas ou declaradas nos relatos publicados.
Discrepâncias entre os protocolos ou registros dos ensaios clínicos e seus relatos publicados foram comuns. Entretanto, as razões para estas discrepâncias não foram discutidas nos relatos. A transparência total dos estudos só será possível quando os protocolos forem públicos ou quando a qualidade e a quantidade das informações incluídas nos registros dos estudos melhorarem. Além disso, os pesquisadores precisam explicar os motivos para mudanças substanciais em seus relatos.
A publicação de todos os resultados dos estudos é essencial para que as pessoas possam tomar decisões bem informadas sobre os cuidados com a saúde. O relato seletivo de determinados resultados de ensaios clínicos randomizados (ECRs) é um problema comum.
Rever sistematicamente estudos de coortes de ECRs que compararam o conteúdo dos relatos dos ECRs com as informações contidas em seus protocolos, ou em seu registro.
Fizemos buscas nas seguintes bases de dados eletrônicas: Ovid MEDLINE (1950 a agosto de 2010); Ovid EMBASE (1980 a agosto de 2010); ISI Web of Science (1900 a agosto de 2010) e the Cochrane Methodology Register (Edição 3, 2010). Além disso, verificamos as listas de referências dos estudos incluídos e entramos em contato com autores de estudos elegíveis para identificar outros estudos. Não excluímos estudos com base no idioma de publicação ou com base na nossa avaliação de sua qualidade.
Estudos de coorte publicados ou não publicados que compararam o conteúdo de protocolos ou registros de ensaios clínicos com os relatos publicados.
Dois autores, trabalhando de forma independente, extraíram os dados dos estudos incluídos. Levamos em consideração o acompanhamento e o relato seletivo de desfechos para avaliar o risco de viés dos estudos de coorte incluídos. Apresentamos separadamente os resultados para a comparação de relatos publicados com protocolos e com registros de ensaios clínicos.
Incluímos 16 estudos que avaliaram uma mediana de 54 ECRs (amplitude: 2 a 362). Doze estudos compararam os relatos publicados com os protocolos e quatro compararam os relatos publicados com os registros dos estudos. Em dois estudos, os critérios de elegibilidade diferiram entre o protocolo e a publicação em 19% e 100% de ECRs, respectivamente. Em um estudo, 16% (9/58) dos relatos incluíram o mesmo cálculo do tamanho da amostra que o protocolo. Em um estudo, 6% (4/63) dos pares de protocolos-relatos deram informações conflitantes sobre o método de ocultação da alocação e 67% (49/73) dos estudos cegos relataram informações discrepantes sobre quem estava cego. Em um estudo foram encontradas discrepâncias não mencionadas nos métodos de lidar com desvios de protocolo (44%; 19/43), dados perdidos (80%; 39/49), análises de desfechos primários (60%; 25/42) e análises ajustadas (82%; 23/28). Um estudo descobriu que de 13 protocolos que especificaram análises de subgrupos, 12 relataram apenas algumas, ou nenhuma destas análises. Dois estudos constataram que resultados estatisticamente significativos tinham maiores probabilidades de serem totalmente relatados em comparação com estudos com resultados não significativos (amplitude de odds ratios: 2,4 a 4,7). Em 4-50% dos relatos dos estudos, pelo menos um desfecho primário foi alterado, introduzido ou omitido.
Tradução do Cochrane Brazil (Ana Carolina Pereira Nunes Pinto). Contato: tradutores.cochrane.br@gmail.com