Os efeitos do tratamento em estudos randomizados diferem quando se utiliza placebo ativo em comparação com placebo padrão?

Mensagens-chave

1. Não encontramos nenhuma diferença clara no efeito entre os placebos ativos e padrão, mas estamos muito incertos a respeito destes resultados.

2. Sugerimos que os pesquisadores considerem cuidadosamente o tipo de placebo ao investigar medicamentos com efeitos secundários/colaterais evidentes.

O que são placebos padrão e placebos ativos?

O cegamento (ou mascaramento) é uma parte importante dos ensaios clínicos randomizados e garante que os participantes e os profissionais de saúde não saibam e, portanto, não sejam influenciados por saber se o participante está recebendo o tratamento experimental ou não. Se os participantes ou profissionais tivessem esse conhecimento, eles poderiam superestimar (ou subestimar) involuntariamente o efeito do tratamento. Um método de cegamento (mascaramento) existente é aquele em que é dado ao grupo de participantes não tratados um placebo, que se parece com o medicamento (por exemplo, um comprimido de formato, cor, cheiro, sabor e textura semelhantes), mas não contém os seus ingredientes ativos.

Entretanto, realizar o cegamento com placebo pode nem sempre ser bem-sucedido. Isto porque o tratamento pode ter efeitos secundários/colaterais diferentes do placebo, de modo que o participante ou profissional percebe em que grupo está e o efeito do tratamento ainda não é medido com precisão. Por esta razão, alguns estudos utilizam placebos ativos, que imitam alguns dos efeitos secundários/colaterais do medicamento experimental. No entanto, não está claro se o tipo de placebo realmente faz diferença nos efeitos do tratamento.

O que queríamos saber?

Queríamos saber se os efeitos do tratamento em ensaios clínicos randomizados diferem quando se utilizam placebos ativos em comparação com placebos padrão.

O que nós fizemos?

Coletamos dados de estudos que compararam diretamente os dois tipos de placebo, ou que compararam ambos os placebos com um medicamento experimental, e analisamos estes dados. Fizemos isto porque, se as pessoas que recebem placebo ativo obtiverem melhores resultados do que aquelas que recebem placebo padrão, esta diferença pode dever-se ao fato de estas pessoas acreditarem que estão recebendo o medicamento experimental. Isto significaria também que, em estudos que comparam um medicamento com um placebo padrão, o efeito benéfico do medicamento é exagerado. Isto é importante se os benefícios medidos do tratamento forem pequenos ou moderados e, portanto, especialmente sensíveis a mudanças nos métodos utilizados no estudo.

O que nós encontramos?

Incluímos 21 estudos nesta revisão, abrangendo assuntos como dor e psiquiatria. Não encontramos nenhuma diferença clara entre os dois tipos de placebo nos resultados relatados pelos participantes (como intensidade da dor). No entanto, como o resultado era impreciso/incerto, o intervalo possível deste resultado incluía não haver diferença e uma diferença potencialmente importante a favor do placebo ativo. Quando limitamos a nossa análise a estudos de maior qualidade, os placebos ativos foram mais benéficos do que os placebos padrão. Entretanto, estes estudos não eram ensaios clínicos típicos e podem não ser aplicáveis ​​a cenários clínicos.

Conclusão dos autores: 

Não encontramos diferença estatisticamente significativa entre placebo ativo e padrão em nossa análise primária. Entretanto, o resultado foi impreciso e o IC compatível com uma diferença que varia de importante a irrelevante. Além disso, o resultado não foi robusto, porque duas análises de sensibilidade produziram uma diferença mais pronunciada e estatisticamente significativa. Sugerimos que os pesquisadores e usuários das informações dos estudos considerem cuidadosamente o tipo de placebo utilizado em grupos controle em estudos com alto risco de perda do cegamento, como aqueles com efeitos não terapêuticos (secundários/colaterais) evidentes/pronunciados e desfechos relatados pelos participantes.

Leia o resumo na íntegra...
Introdução: 

Estima-se que 60% dos ensaios clínicos randomizados sobre intervenções farmacológicas utilizam intervenções controladas com placebo para cegar (ou seja, mascarar) os participantes. No entanto, os placebos padrão não controlam os efeitos não terapêuticos perceptíveis (isto é, os efeitos secundários/colaterais) do medicamento do grupo experimental, o que pode levar os participantes a perceberem em que grupo do estudo estão. Os estudos raramente utilizam grupos controles com placebos ativos, que contêm compostos farmacológicos feitos para imitar os efeitos experimentais não terapêuticos dos medicamentos (os efeitos secundários/colaterais), a fim de reduzir o risco de o participante saber se está ou não tomando o medicamento experimental. A identificação de um efeito importantemente melhor do placebo ativo em comparação com o placebo padrão indicaria que os estudos com placebo padrão podem superestimar os efeitos do medicamento do grupo experimental.

Objetivos: 

Nosso objetivo foi estimar a diferença de efeitos quando o medicamento do grupo experimental é comparado com um placebo ativo versus uma intervenção no grupo controle com placebo padrão, e explorar as causas da heterogeneidade. No contexto de um ensaio clínico randomizado, esta diferença nos efeitos dos medicamentos pode ser estimada ao comparar diretamente a diferença de efeitos entre o grupo placebo ativo e o placebo padrão.

Métodos de busca: 

Fizemos buscas no PubMed, CENTRAL, Embase, duas outras bases de dados e dois registros de ensaios clínicos até outubro de 2020. Também verificamos as listas de referências e citações e contatamos os autores dos estudos.

Critério de seleção: 

Incluímos ensaios clínicos randomizados que compararam um placebo ativo versus um placebo padrão. Consideramos estudos com e sem grupo de medicamento experimental correspondente.

Coleta dos dados e análises: 

Extraímos dados, avaliamos o risco de viés, classificamos os placebos ativos quanto à adequação e risco de efeitos terapêuticos não intencionais (efeitos secundários/colaterais) e categorizamos os placebos ativos como desagradáveis, neutros ou agradáveis. Solicitamos dados individuais dos participantes aos autores de quatro estudos cross-over (ensaios cruzados) publicados após 1990 e de um estudo não publicado registrado após 1990. Utilizamos na nossa meta-análise primária o método de variância inversa e modelo de efeitos aleatórios para estimar diferenças médias padronizadas (DMPs) de placebo ativo versus placebo padrão de desfechos relatados pelos participantes na primeira avaliação pós-tratamento. Uma DMP negativa favoreceu o placebo ativo. Estratificamos as análises por tipo de estudo (clínico ou pré-clínico) e complementamos com análises de sensibilidade e subgrupos e meta-regressão. Em análises secundárias, avaliamos os desfechos relatados pelo observador, danos, atrito e desfechos de co-intervenções.

Principais resultados: 

Incluímos 21 estudos, com um total de 1.462 participantes. Obtivemos dados individuais dos participantes de quatro estudos. Nossa análise primária dos desfechos relatados pelos participantes na primeira avaliação pós-tratamento resultou em uma DMP agrupada de -0,08 (intervalo de confiança (IC) de 95% -0,20 a 0,04; I 2 = 31%; 14 estudos), sem diferença clara entre estudos clínicos e pré-clínicos. Os dados individuais dos participantes contribuíram com 43% do peso desta análise. Duas das sete análises de sensibilidade encontraram diferenças mais pronunciadas e estatisticamente significativas. Por exemplo, nos cinco estudos com baixo risco geral de viés, a DMP agrupada foi de -0,24 (IC 95% -0,34 a -0,13). A DMP agrupada dos desfechos relatados pelo observador foi semelhante à análise primária. O odds ratio (OR) agrupado para os danos foi de 3,08 (IC 95% 1,56 a 6,07) e para atrito 1,22 (IC 95% 0,74 a 2,03). Os dados de co-intervenção foram limitados. Na meta-regressão não encontramos associação estatisticamente significativa com a adequação do placebo ativo ou risco de efeito terapêutico não intencional (efeitos secundários/colaterais).

Notas de tradução: 

Tradução do Cochrane Brazil (Ana Carolina Pereira Nunes Pinto). Contato: tradutores.cochrane.br@gmail.com

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