Podcast: Percepções e experiências sobre a prevenção, detecção e manejo da hemorragia pós-parto: uma síntese de evidências qualitativas

O Grupo Cochrane de Gravidez e Parto produziu mais de 650 Revisões Cochrane desde a sua fundação há 30 anos, sendo o primeiro Grupo de Revisão da Cochrane. Várias destas revisões estão relacionadas à hemorragia pós-parto, e uma nova revisão de pesquisas qualitativas foi adicionada em novembro de 2023. Essa revisão também contou com o apoio do Grupo Cochrane de Prática Eficaz e Organização do Cuidado. Neste podcast, Thiago Melo e Fabiana Lorencatto irão narrar em  Português a conversa de Martha Vazquez Corona com a autora correspondente Meghan Bohren, chefe da unidade de Gênero e Saúde da Mulher da Universidade de Melbourne, Austrália, sobre a revisão sistemática e os seus resultados.

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O Grupo Cochrane de Gravidez e Parto produziu mais de 650 Revisões Cochrane desde a sua fundação há 30 anos, sendo o primeiro Grupo de Revisão da Cochrane. Várias destas revisões estão relacionadas à hemorragia pós-parto, e uma nova revisão de pesquisas qualitativas foi adicionada em novembro de 2023. Essa revisão também contou com o apoio do Grupo Cochrane de Prática Eficaz e Organização do Cuidado. Neste podcast, Thiago Melo e Fabiana Lorencatto irão narrar em  Português a conversa de Martha Vazquez Corona com a autora correspondente Meghan Bohren, chefe da unidade de Gênero e Saúde da Mulher da Universidade de Melbourne, Austrália, sobre a revisão sistemática e os seus resultados.

Thiago: Olá, Fabiana. Primeiramente, você pode nos falar um pouco sobre a hemorragia pós-parto? O que é e como ela afeta as mulheres em todo o mundo?

Fabiana: Olá, Thiago. A hemorragia pós-parto ocorre quando as mulheres têm uma perda excessiva de sangue após o parto. É a principal causa de mortalidade materna em todo o mundo e quase todas estas mortes ocorrem em países de baixa e média renda. A hemorragia pós-parto é um problema tão sério que a Organização Mundial da Saúde recomenda que todas as mulheres que dão à luz recebam uterotônicos para tentar evitá-la. Porém, a maioria das mulheres com hemorragia pós-parto não apresenta fatores de risco identificáveis. Isso significa que o monitoramento cuidadoso da perda de sangue durante e após o parto é crucial para detecção e intervenção precoce do problema, se necessário. Felizmente, as revisões Cochrane indicam que existem intervenções eficazes, incluindo uterotônicos, ácido tranexâmico, líquidos intravenosos e massagem uterina.

Thiago: Então, qual é a importância dessa revisão Cochrane de pesquisas qualitativas sobre a prevenção, detecção e manejo da hemorragia pós-parto, dadas as outras revisões sobre a eficácia das intervenções?

Fabiana: Bem, mesmo que existam intervenções eficazes para prevenir, detectar e manejar a hemorragia pós-parto, elas não são bem implementadas na prática, especialmente nos países de baixa e média renda. Pesquisas qualitativas podem nos ajudar a entender as razões por trás disso. As pesquisas e os programas de saúde materna nos mostram que as preferências pessoais e os valores das mulheres influenciam suas decisões na hora de acessar unidades de saúde para serviços de assistência ao parto. Por isso, é muito importante entender as percepções e experiências das mulheres com relação à hemorragia pós-parto, para avaliar a influência de fatores individuais e comunitários. Também estávamos interessadas em compreender os desafios e oportunidades enfrentados pelos quais profissionais de saúde e outros atores do sistema de saúde e que podem afetar a prestação de cuidados.
A síntese dessas evidências ajudará pesquisadores e formuladores de políticas a identificar lacunas críticas na hora de implementar as práticas recomendadas para a hemorragia pós-parto.

Thiago: E o que as evidências que vocês encontraram dizem sobre as percepções e experiências da hemorragia pós-parto?

Fabiana: Bem, nós encontramos 67 estudos que atendiam aos nossos critérios de elegibilidade, e selecionamos 43 deles para inclusão na análise. Os 43 estudos foram realizados em 26 países, sendo que 31 ocorreram em países de baixa ou média renda. Os estudos incluíram principalmente as perspectivas das mulheres, familiares ou dos membros da comunidade, e também dos trabalhadores das unidades de saúde e agentes comunitários.

Thiago: Obrigado. Parece que vocês tinham uma boa variedade de pesquisas. Nos conte sobre os principais achados, começando com aqueles relacionados às crenças comunitárias.

Fabiana: Descobrimos que as crenças culturais sobre o sangramento pós-parto influenciavam as perspectivas das mulheres e da comunidade sobre a hemorragia pós-parto. Por exemplo, em muitas comunidades, o sangramento durante e após o parto era considerado "normal" e necessário para restaurar e limpar o corpo da mulher após a gravidez e o parto. Algumas comunidades acreditavam que a hemorragia pós-parto era causada por poderes sobrenaturais ou espíritos malignos. Isso significa que quando as mulheres davam à luz em casa ou em comunidades, as crenças culturais sobre a perda de sangue poderiam levar a atrasos na busca por cuidados que poderiam salvar a vida da mulher.

Thiago: E quanto à perspectiva dos profissionais de saúde que trabalham nas unidades de saúde?

Fabiana: Nas unidades de saúde, os profissionais muitas vezes tinham dificuldade em estimar a quantidade de sangue perdida após o parto. Para estes profissionais, quantificar a perda de sangue era complexo, e era uma mudança de prática polêmica.
Se as mulheres tivessem uma hemorragia pós-parto, os profissionais de saúde identificaram desafios comuns no manejo dessa hemorragia, incluindo falta de pessoal, condições de trabalho estressantes, treinamento insuficiente e falta de medicamentos e suprimentos. Esses desafios resultavam em atrasos no manejo oportuno da hemorragia pós-parto.
Os profissionais de saúde também destacaram algumas estratégias úteis para melhorar a detecção e o manejo da hemorragia pós-parto. Isso inclui treinamentos de simulação em equipe reunindo diferentes tipos de profissionais da saúde, como obstetrizes e obstetras. Esse tipo de treinamento ajudava as equipes de profissionais de saúde a desenvolver um modelo mental compartilhado para trabalhar de maneira rápida, eficiente e de forma amigável como equipe.

Thiago: Por último, mas não menos importante, o que vocês encontraram sobre as experiências das mulheres que sobreviveram a uma hemorragia pós-parto?

Fabiana: O tema mais comum foi que as mulheres descreveram a experiência da hemorragia pós-parto como dolorosa, vergonhosa e traumática. Seus parceiros e familiares também acharam a experiência estressante.
Algumas mulheres descreveram insatisfação com seu nível de envolvimento na tomada de decisões para o manejo da hemorragia pós-parto, enquanto outras sentiram que os profissionais de saúde tinham melhores condições para tomar estas decisões. Porém, as mulheres que tiveram que ser submetidas a histerectomia devido a uma hemorragia pós-parto grave tinham fortes crenças que uma discussão abrangente e o consentimento informado eram críticos, dadas as consequências físicas e emocionais duradouras de uma histerectomia.

Thiago: Muito obrigado pela explicação. Então, qual é a mensagem principal sobre a prevenção, detecção e manejo da hemorragia pós-parto que você gostaria de destacar?

Fabiana: Nossa síntese de evidências qualitativas destaca como a melhora da prevenção, detecção e manejo da hemorragia pós-parto depende de um sistema complexo que envolve a atuação e comportamentos das mulheres, membros da comunidade e profissionais de saúde. É essencial levar em conta essas questões mais amplas ao desenvolver intervenções para melhorar (a assistência) a hemorragia pós-parto.
Para ajudar nisso, no final da síntese de evidências qualitativas, incluímos algumas sugestões para ajudar gerentes de programas, formuladores de políticas, pesquisadores e outros interessados a identificar e abordar os fatores que afetam a implementação e ampliação de intervenções para melhorar a prevenção, detecção e manejo da hemorragia pós-parto.

Thiago: Muito obrigado, Fabiana. Se as pessoas que estão nos ouvindo quiserem ler a revisão, onde elas podem encontrá-la?

Fabiana: Muito obrigada, Thiago. Ela está disponível online. Se elas acessarem o site cochranelibrary.com e digitarem "síntese de evidências qualitativas e hemorragia pós-parto" em inglês na caixa de pesquisa, encontrarão o link para a revisão.

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