Qual foi o objetivo desta revisão?
O objetivo desta revisão Cochrane foi avaliar os efeitos dos programas que usam a estratégia da Organização Mundial de Saúde de gestão integrada de doenças infantis (GIDI). Procuramos por todos os estudos potencialmente relevantes e encontrarmos quatro que atendiam aos critérios da revisão.
Principais achados
A revisão concluiu que o uso da estratégia GIDI da Organização Mundial de Saúde pode diminuir o risco de morte de crianças com até cinco anos de idade. Os efeitos da GIDI em outras questões, como a doença ou a qualidade do cuidado, foram heterogêneos e a qualidade da evidência para estas questões foi muito baixa. No futuro, os pesquisadores devem investigar como a GIDI pode ser melhor implementada.
O que foi estudado nesta revisão?
Em todo o mundo, estima-se que a cada ano mais de 7,5 milhões de crianças morrem antes de completarem 5 anos de idade. A maioria dessas crianças vive em comunidades pobres dos países mais pobres. Estas crianças têm maior risco de desnutrição e de ter infecções, como sepse neonatal, sarampo, diarreia, malária e pneumonia.
Existem estratégias efetivas para prevenir doenças e tratar crianças doentes, porém essas intervenções não chegam até elas. Uma razão para isto é que os serviços de saúde muitas vezes ficam longe de onde elas vivem ou são muito caros. Frequentemente, os serviços de saúde nestes locais não têm os suprimentos necessários e também não contam com profissionais de saúde bem treinados. Além do mais, as crianças doentes podem ter muitos problemas de saúde ao mesmo tempo, e isto pode dificultar o diagnóstico e o tratamento para os profissionais de saúde.
Na década de 1990, a Organização Mundial de Saúde (OMS) desenvolveu uma estratégia chamada gestão integrada de doenças infantis (GIDI) para tratar estes problemas. Os objetivos desta estratégia são prevenir a morte e a doença, e melhorar a qualidade do cuidado oferecido à crianças doentes com até cinco anos de idade. A GIDI tem três elementos.
• Melhorar as habilidades dos profissionais de saúde através de treinamentos e diretrizes.
• Melhorar a organização e o gerenciamento dos sistemas de saúde, incluindo acesso aos suprimentos.
• Visitas domiciliares e comunitárias para promover boas práticas no cuidado das crianças e uma boa alimentação, e encorajar os pais a levar seus filhos para uma clínica quando eles ficarem doentes.
A OMS encoraja os países a adaptarem a estratégia GIDI para sua própria realidade nacional. Pode haver diferenças entre os países quanto aos tipos de doenças infantis que devem ser priorizadas e quanto à forma como os serviços são oferecidos.
Quais são os principais resultados da revisão?
A revisão Cochrane incluiu quatro estudos que avaliaram a efetividade da estratégia GIDI. Estes estudos foram conduzidos na Tanzânia, Bangladesh, e Índia. Esses estudos usaram a estratégia GIDI de forma bastante diferente. Por exemplo, o estudo da Tanzânia implementou o treinamento para profissionais de saúde e melhorou o fornecimento de medicações, mas não incluiu visitas domiciliares ou atividades na comunidade. O estudo de Bangladesh recrutou mais profissionais de saúde enquanto treinava os profissionais existentes. Os dois estudos indianos focavam suas ações em recém-nascidos e também em crianças mais velhas.
Esta revisão concluiu que o uso da GIDI:
• pode reduzir a mortalidade de crianças com 0 até 5 anos (evidência de baixa qualidade);
• pode ter pouco ou nenhum efeito sobre o número de crianças com problemas de crescimento (evidência de baixa qualidade);
• provavelmente tem pouco ou nenhum efeito sobre o número de crianças desnutridas (evidência de qualidade moderada);
• provavelmente tem pouco ou nenhum efeito sobre as crianças que são vacinadas contra o sarampo; e
• pode ter efeitos variáveis sobre o número de pais que buscam atendimento para os seus filhos quando eles ficam doentes.
Não sabemos se a GIDI tem algum efeito sobre a maneira como os profissionais de saúde tratam doenças comuns porque a qualidade desta evidência foi muito baixa.
Não sabemos se a GIDI tem algum efeito sobre o número de mães que amamentam exclusivamente os seus filhos porque a qualidade desta evidência foi muito baixa.
Nenhum dos estudos incluídos avaliou a satisfação das mães e dos usuários do serviço com a estratégia GIDI.
Quão atual é esta revisão?
Os autores da revisão buscaram por todos estudos que haviam sido publicados até 30 de junho de 2015.
O conjunto de intervenções da GIDI variou entre os estudos, e alguns estudos incluíram intervenções específicas para melhorar a saúde neonatal. A maioria dos estudos foi no sul da Ásia. A implementando da GIDI pode reduzir a mortalidade na infância, e pacotes que incluam intervenções para o período neonatal podem reduzir a mortalidade infantil (morte de crianças com menos de 1 ano de idade). A GIDI tem pouco ou nenhum efeito sobre o estado nutricional e sobre a cobertura vacinal. A GIDI pode incentivar o comportamento materno de buscar cuidados de saúde para seus filhos. Porém, esses resultado, assim como os resultados sobre o aumento da amamentação exclusiva, foram heterogêneos e a qualidade dessa evidência foi muito baixa.. Portanto, existe muita incerteza quanto aos efeitos da GIDI sobre esses desfechos.
A cada ano, morrem mais de 7,5 milhões de crianças com menos de cinco anos em países de baixa e média renda. A Organização Mundial de Saúde (OMS) desenvolveu a estratégia da gestão integrada de doenças infantis (GIDI) para reduzir a mortalidade e a morbidade e melhorar a qualidade dos cuidados. A estratégia tenta melhorar a oferta de várias intervenções médicas curativas e preventivas e de intervenções comportamentais em instituições de saúde, em casa, e na comunidade.
Avaliar os efeitos dos programas que implementaram a estratégia GIDI sobre a mortalidade, estado nutricional, qualidade do cuidado, cobertura dos serviços ofertados pela GIDI, e a satisfação dos beneficiários.
Fizemos buscas nas seguintes bases de dados: Central Register of Controlled Trials (CENTRAL; 2015, Issue 3), incluindo a Cochrane Effective Practice and Organisation of Care (EPOC) Group Specialised Register; MEDLINE; EMBASE, Ovid; the Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), EbscoHost; the Latin American Caribbean Health Sciences Literature (LILACS), Virtual Health Library (VHL); the WHO Library & Information Networks for Knowledge Database (WHOLIS); the Science Citation Index and Social Sciences Citation Index, Institute for Scientific Information (ISI) Web of Science; Population Information Online (POPLINE); the WHO International Clinical Trials Registry Platform (WHO ICTRP); e Global Health, Ovid and Health Management,ProQuest database. Fizemos a busca até 30 de junho de 2015. Complementamos a busca avaliando listas de referências e entrando em contato com especialistas para identificar estudos não publicados e em andamento.
Incluímos ensaios clínicos randomizados (ECRs) e estudos controlados antes-depois (CBA) que tivessem pelo menos duas intervenções e dois locais controlados. Os estudos deveriam avaliar uma estratégia genérica GIDI ou adaptações dela, em crianças com menos de cinco anos, e incluir pelo menos intervenções para melhorar as habilidades dos profissionais de saúde para atender os casos. Excluímos os estudos em que a GIDI foi acompanhada por outras intervenções incluindo transferências monetárias condicionais, suplementação alimentar, e empregos. O grupo de comparação recebeu os serviços de saúde habituais sem a GIDI.
Dois autores, trabalhando de forma independente, selecionaram os estudos, e extraíram, analisaram e tabularam os dados. Para os ECR tipo cluster, usamos a variância inversa e um valor de 0,01 para o coeficiente intracluster para os estudos que não fizeram ajustes. Usamos o GRADE (Grades of Recommendation, Assessment, Development and Evaluation Working Group) para avaliar a qualidade das evidências.
Dois ECR tipo cluster (Índia e Bangladesh) e dois estudos controlados antes e depois (Tanzânia e Índia ) preencheram nossos critérios de inclusão. As intervenções incluíam treinamento da equipe de saúde, fortalecimento da gestão dos sistemas de saúde (quatro estudos), e visitas domiciliares (dois estudos). Os dois estudos indianos incluíram pacotes de cuidados para recém nascidos..
Um ECR em Bangladesh relatou uma redução de 13% na mortalidade de crianças menores de 5 anos no grupo da GIDI, porém o intervalo de confiança (IC) incluiu a possibilidade de não haver nenhum efeito: razão de risco (RR) 0,87, IC 95% 0,68 a 1,10, 5090 participantes, evidência de baixa qualidade. Um estudo CBA na Tanzânia relatou estimativas quase idênticas: RR 0,87, IC 95% 0,72 a 1,05, 1932 participantes.
Um ECR na Índia avaliou mudanças na mortalidade infantil e neonatal com a implementação da estratégia de gestão integrada de doenças neonatais e infantis (GIDNI) incluindo visitas domiciliares após o parto. A mortalidade neonatal e infantil foi menor no grupo da GIDNI do que no grupo controle: razão de incidência (hazard ratio-HR) de mortalidade infantil 0,85, IC 95% 0,77 a 0,94; HR mortalidade neonatal 0,91, IC 95% 0,80 a 1,03 (1 estudo, 60.480 participantes, evidência de baixa qualidade).
Estimamos o efeito da GIDI sobre qualquer tipo de mortalidade combinando a mortalidade na infância (antes dos 5 anos) e a mortalidade infantil (no 1o ano de vida) do ECR da GIDI e do ECR da GIDNI. A GIDI pode reduzir a mortalidade: RR 0,85, IC 95% 0,78 a 0,93, 2 estudos, 65.570 participantes, evidência de baixa qualidade.
Dois ECRs (Índia e Bangladesh) avaliaram o estado nutricional e relataram que a intervenção teve pouco ou nenhum efeito sobre problemas de crescimento (RR 0,94 IC 95% 0,84 a 1,06, 5242 participantes, 2 estudos, evidência de baixa qualidade) e sobre a desnutrição (RR 1,04, IC 95% 0,87 a 1,25, 2 estudos, 4288 participantes, evidência de moderada qualidade). Um estudo CBA da Tanzania relatou resultados semelhantes.
Os investigadores avaliaram a qualidade dos cuidados observando as prescrições para doenças comuns feitas nos serviços de saúde (727 observações, 2 estudos, evidência de qualidade muito baixa) e observando as prescrições feitas pelos trabalhadores de saúde leigos (1051 observações, 3 estudos, evidência de qualidade muito baixa). Como a qualidade da evidência foi muito baixa, não foi possível confirmar um efeito consistente da intervenção sobre as prescrições feitas nos serviços de saúde ou por profissionais de saúde leigos.
Para avaliar a cobertura das intervenções GIDI, analisamos a cobertura vacinal e de vitamina A, a busca apropriada por cuidados, e o aleitamento materno exclusivo. Dois ECRs (na Índia e Bangladesh) relataram que a intervenção teve pouco ou nenhum efeito sobre a cobertura vacinal para sarampo: RR 0,92, IC 95% 0,80 a 1,05, 2 estudos, 4895 participantes, evidência de qualidade moderada. O estudo CBA da Tanzânia relatou efeitos semelhantes. Dois estudos mediram a terceira dose da vacina de difteria, coqueluche e tétano, e dois mediram a cobertura de vitamina A. Esses estudos relataram que a GIDI teve pouco ou nenhum efeito sobre esses desfechos.
Quatro estudos (2 da Índia,1 da Tanzânia e 1 de Bangladesh) entrevistaram as mães usando questionários detalhados sobre doenças recentes e relataram que a intervenção promoveu uma busca adequada por cuidados de saúde. Apesar de alguns estudos relataram que a GIDI melhorou o comportamento de busca por cuidados, outros não tiveram os mesmos resultados.
Os quatro estudos avaliaram a amamentação exclusiva. Os resultados foram heterogêneos e a qualidade da evidência foi muito baixa. Portanto, não sabemos se a GIDI tem algum impacto sobre a amamentação exclusiva.
Nenhum estudo avaliou a satisfação das mães e dos usuários dos serviços de saúde.
Tradução do Centro Cochrane do Brasil (Daniel Damasceno Bernardo) - contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br