Mensagens‐chave
• Para mulheres grávidas HIV positivas, adicionar um medicamento para tratamento da malária (como mefloquina ou diidroartemisinina/piperaquina) ao tratamento usual de prevenção de infecções para pessoas com HIV (cotrimoxazol diário):
- provavelmente reduz o risco da mãe estar infectada com malária quando der à luz ao seu bebê;
- provavelmente reduz a infecção da malária na placenta;
- provavelmente não afeta o risco de perder o bebê antes ou depois do parto, ou do bebê nascer com baixo peso.
• Embora a mefloquina, quando adicionada ao cotrimoxazol diário, provavelmente reduza o risco de infecção por malária em mulheres HIV positivas, ela provavelmente aumenta o risco de transmissão do HIV de mãe para filho e pode ter um risco maior de reações negativas aos medicamentos.
• Diidroartemisinina/piperaquina, quando adicionada ao cotrimoxazol diário, provavelmente reduz o risco de malária na placenta de mulheres grávidas HIV positivas. Provavelmente não faz diferença no risco de baixo peso ao nascer ou de perder o bebê antes ou depois do nascimento, ou no risco de efeitos colaterais menores, como vômitos.
Por que a prevenção da malária em mulheres grávidas HIV positivas é importante?
Mulheres grávidas soropositivas são vulneráveis à malária. Ter malária e HIV pode piorar a malária na gravidez, aumentando o risco de complicações de saúde para as mulheres e seus bebês. O uso diário de um medicamento chamado cotrimoxazol é recomendado para prevenir infecções em pessoas vivendo com HIV, incluindo mulheres grávidas, em muitos países onde a malária é comum. O medicamento recomendado para prevenir a malária na gravidez, sulfadoxina-pirimetamina, não pode ser tomado por mulheres que tomam cotrimozaxol devido às potenciais interações negativas entre os dois medicamentos.
O que queríamos saber?
Queríamos saber se os medicamentos para tratamento da malária atualmente disponíveis são efetivos e seguros quando utilizados para prevenir a malária em mulheres grávidas HIV positivas. Esta é uma atualização de uma revisão da Cochrane publicada em 2011.
O que nós fizemos?
Buscamos estudos que investigaram os benefícios e prejuízos dos medicamentos para tratamento da malária utilizados para prevenção da malária em mulheres grávidas HIV positivas. Combinamos os resultados desses estudos.
O que nós encontramos?
Encontramos 14 estudos com 4.976 mulheres grávidas HIV positivas. Os estudos foram realizados entre 2002 e 2023 em países da África Subsaariana: Benim, República Centro-Africana, Gabão, Malawi, Moçambique, Nigéria, Quênia, Tanzânia, Togo, Uganda e Zâmbia. Os estudos testaram nove comparações de diferentes regimes medicamentosos.
Quais são os nossos principais resultados?
Adicionar um medicamento para tratamento da malária, como mefloquina ou diidroartemisinina/piperaquina, ao cotrimoxazol diário provavelmente reduz o risco de infecção por malária no sangue da mãe no momento do parto e na placenta. Provavelmente não aumenta nem diminui o risco de ter um bebê com baixo peso ao nascer ou de perdê-lo antes ou depois do nascimento. Provavelmente não aumenta nem diminui o risco de anemia na mãe (ou seja, baixo nível de ferro no sangue). Não sabemos se isso tem algum efeito sobre o risco de parasitas da malária no cordão umbilical do bebê.
Embora a mefloquina provavelmente reduza o risco de infecção por malária, ela provavelmente aumenta o risco de transmissão do HIV de mãe para filho e pode ter maior probabilidade de causar efeitos negativos relacionados ao medicamento, quando comparada ao uso de cotrimoxazol diário isolado.
Quando analisamos separadamente os estudos que avaliaram diidroartemisinina/piperaquina, descobrimos que a adição dessa combinação ao cotrimoxazol diário provavelmente não reduz a presença de parasitas Plasmodium no sangue da mãe no momento do parto, nem seu risco de anemia, mas reduz a infecção por malária na placenta. Provavelmente não aumenta ou diminui o risco de baixo peso ao nascer ou de perder o bebê antes ou depois do nascimento. O uso de diidroartemisinina/piperaquina com cotrimoxazol diário pode não aumentar o risco de transmissão do HIV de mãe para filho, em comparação com o uso de cotrimoxazol diário sozinho, e pode não aumentar o risco de efeitos colaterais negativos decorrentes do uso do medicamento.
Quais são as limitações das evidências?
Em relação ao tratamento preventivo de rotina para mulheres HIV positivas (cotrimoxazol diário) em combinação com qualquer outro medicamento (mefloquina ou diidroartemisinina/piperaquina), temos confiança nas evidências referentes à anemia materna no momento do parto. Estamos moderadamente confiantes nas evidências sobre a presença de parasitas no sangue e na placenta da mãe, bebês nascidos com baixo peso ao nascer, natimortos e abortos espontâneos. É possível que as pessoas em um dos estudos soubessem quem havia recebido cada esquema de medicamentos, o que pode ter afetado os resultados do estudo. Estamos menos confiantes em nossos resultados quanto à presença de parasitas no sangue do cordão umbilical e ao risco de o bebê morrer após o nascimento, porque os resultados dos estudos variaram muito.
Em relação ao tratamento preventivo de rotina (cotrimoxazol diário) em combinação com diidroartemisinina/piperaquina especificamente, estamos confiantes nas evidências sobre a infecção por malária detectada pela presença de parasitas na placenta da mãe. Estamos moderadamente confiantes nas evidências sobre a presença de parasitas no sangue da mãe, anemia materna no momento do parto, bebês nascidos com baixo peso, natimortos, abortos espontâneos e mortes infantis. Estamos menos confiantes em nossos resultados quanto aos efeitos colaterais do medicamento e à transmissão do HIV da mãe para o bebê.
Até que ponto estas evidências estão atualizadas?
Estas evidências estão atualizadas até 31 de Agosto de 2024.
A adição de diidroartemisinina/piperaquina e mefloquina ao cotrimoxazol diário parece ser eficaz na prevenção de infecções por malária em gestantes HIV positivas, em comparação com o uso de cotrimoxazol diário isolado. No entanto, o aumento do risco de transmissão do HIV ao feto e a baixa tolerabilidade do medicamento podem ser barreiras à implementação da mefloquina na prática. Por outro lado, as evidências sugerem que a diidroartemisinina/piperaquina não aumenta o risco de transmissão de HIV de mãe para filho e é bem tolerada.
A malária e a infecção pelo HIV se sobrepõem geograficamente na África Subsaariana e compartilham fatores de risco. A infecção pelo HIV aumenta a gravidade da malária, especialmente em gestantes. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda o tratamento preventivo intermitente na gravidez (IPTp) com sulfadoxina-pirimetamina (SP) para gestantes que vivem em áreas endêmicas. Entretanto, mulheres HIV positivas em profilaxia diária com cotrimoxazol (recomendado para prevenção de infecções oportunistas em pessoas vivendo com HIV) não podem receber SP devido a interações medicamentosas adversas, então a prevenção da malária nessa população vulnerável atualmente depende da profilaxia diária apenas com cotrimoxazol. Esta revisão é baseada em um novo protocolo e fornece uma atualização da revisão Cochrane de 2011 que avaliou medicamentos alternativos para IPTp para prevenir a malária em mulheres HIV positivas.
Comparar a segurança e a eficácia dos regimes de tratamento preventivo intermitente para a prevenção da malária em gestantes HIV positivas.
Fizemos buscas até 31 de Janeiro de 2024 nas seguintes bases de dados: CENTRAL, MEDLINE, Embase, quatro outras bases de dados e dois registros de ensaios clínicos. Para identificar estudos adicionais relevantes ou trabalhos não publicados, verificamos as referências e entramos em contato com autores de estudos e outros pesquisadores que trabalham com malária e HIV.
Incluímos ensaios clínicos randomizados (ECRs) comparando qualquer regime de tratamento preventivo intermitente para prevenção da malária em gestantes HIV positivas com a profilaxia diária de cotrimoxazol isolado, placebo, tratamento padrão atual ou anterior ou combinações dessas opções. Por "tratamento padrão" nos referimos ao regime de medicamentos recomendado pelo país para prevenir a malária na gravidez em mulheres HIV positivas, ou ao tratamento que a equipe de pesquisa de um estudo considerou ser o padrão de tratamento.
Os autores da revisão, em pares, selecionaram de forma independente todos os registros identificados pela estratégia de busca, aplicaram os critérios de inclusão, avaliaram o risco de viés nos estudos incluídos e extraíram os dados. Entramos em contato com os autores dos estudos quando informações adicionais foram necessárias. Apresentamos desfechos dicotômicos usando risco relativo (RR), desfechos de contagem como razão de taxas de incidência (RTI) e desfechos contínuos como diferença média (DM). Apresentamos todos os resultados com intervalos de confiança (ICs) de 95%. Avaliamos a certeza das evidências usando a abordagem GRADE para o que consideramos serem as principais comparações e desfechos.
Incluímos 14 ECRs, com um total de 4.976 gestantes HIV positivas inicialmente randomizadas. Todos os estudos avaliaram a eficácia e a segurança de um antimalárico usado como IPTp (mefloquina, diidroartemisinina/piperaquina, SP ou azitromicina) com ou sem cotrimoxazol diário, em comparação com cotrimoxazol diário isolado, placebo ou um regime de tratamento padrão. Agrupamos os estudos em nove comparações. Nossa principal comparação avaliou o atual tratamento padrão (cotrimoxazol diário) com outro regime medicamentoso (mefloquina ou diidroartemisinina/piperaquina) versus cotrimoxazol diário com ou sem placebo. Nessa comparação, dois estudos avaliaram mefloquina e três avaliaram diidroartemisinina/piperaquina. Conduzimos meta-análises que incluíram estudos avaliando dihidroartemisinina/piperaquina em combinação com cotrimoxazol, e estudos que avaliaram mefloquina em combinação com cotrimoxazol, pois consideramos não haver heterogeneidade qualitativa ou quantitativa entre os estudos para a maioria dos desfechos. Consideramos que os eventos adversos relacionados a medicamentos e os desfechos relacionados ao HIV são específicos do medicamento.
A profilaxia diária com cotrimoxazol, combinada com outro regime medicamentoso (mefloquina ou diidroartemisinina/piperaquina), provavelmente resulta em menor risco de parasitemia periférica materna no parto (RR 0,62, IC 95% 0,41 a 0,95; 2406 participantes, 5 estudos; moderada certeza da evidência). Isso resulta em pouca ou nenhuma diferença nos casos de anemia materna no parto (RR 0,98, IC 95% 0,90 a 1,07; 2.417 participantes, 3 estudos; alta certeza da evidência). Isso provavelmente resulta em uma diminuição na malária placentária medida por esfregaço de sangue (RR 0,54, IC de 95% 0,31 a 0,93; 1.337 participantes, 3 estudos; moderada certeza da evidência) e provavelmente resulta em pouca ou nenhuma diferença no baixo peso ao nascer (RR 1,16, IC 95% 0,95 a 1,41; 2.915 participantes, 5 estudos; moderada certeza da evidência). Não há evidências suficientes para determinar se a profilaxia diária com cotrimoxazol combinada com outro regime medicamentoso afeta o risco de parasitemia do sangue do cordão umbilical (RR 0,27, IC 95% 0,04 a 1,64; 2.696 participantes, 5 estudos; muito baixa certeza da evidência).
A profilaxia diária com cotrimoxazol combinada com outro regime medicamentoso provavelmente resulta em pouca ou nenhuma diferença na perda fetal (RR 1,03, IC de 95% 0,73 a 1,46; 2.957 participantes, 5 estudos; moderada certeza da evidência) e pode resultar em pouca ou nenhuma diferença na mortalidade neonatal (RR 1,21, IC 95% 0,68 a 2,14; 2.706 participantes, 4 estudos; baixa certeza da evidência).
Devido à probabilidade de um aumento no risco de transmissão do HIV de mãe para filho e alguns efeitos adversos observados com o uso da mefloquina, também analisamos os resultados especificamente para diidroartemisinina/piperaquina.
O uso de Diidroartemisinina/piperaquina combinada com contrimoxazol diário provavelmente resulta em pouca ou nenhuma diferença na parasitemia periférica materna (RR 0,59, IC 95% 0,31 a 1,11; 1517 participantes, 3 estudos; moderada certeza da evidência) ou anemia no parto (RR 0,95, IC 95% 0,82 a 1,10; 1454 participantes, 2 estudos; moderada certeza da evidência), mas leva a menos mulheres com malária placentária quando medida por análise histopatológica (RR 0,67, IC 95% 0,50 a 0,90; 1570 participantes, 3 estudos; alta certeza da evidência). A adição de diidroartemisinina/piperaquina ao cotrimoxazol diário provavelmente fez pouca ou nenhuma diferença nas taxas de baixo peso ao nascer (RR 1,13, IC 95% 0,87 a 1,48; 1695 participantes, 3 estudos), perda fetal (RR 1,14, IC 95% 0,68 a 1,90; 1610 participantes, 3 estudos) ou mortalidade neonatal (RR 1,03, IC 95% 0,39 a 2,72; 1467 participantes, 2 estudos) (todas com moderada certeza da evidência). Encontramos evidências com baixa certeza de que não há aumento do risco de eventos adversos gastrointestinais relacionados aos medicamentos (RR 1,42, IC 95% 0,51 a 3,98; 1447 participantes, 2 estudos) ou transmissão do HIV de mãe para filho (RR 1,54, IC 95% 0,26 a 9,19; 1063 participantes, 2 estudos).
Tradução do Centro Cochrane do Brasil (Nitza Ferreira Muniz e Mayara Rodrigues Batista) – contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br