Avaliar a capacidade de uma única dose de opióides administrada antes de fazer a primeira incisão durante a cirurgia (opióides preemptivos) e opióides preventivos, que são administrados antes da primeira incisão e continuados após a cirurgia, para reduzir a dor pós-operatória em adultos.
Pergunta de revisão
Revimos a evidência sobre opióides (analgésicos fortes) quando administrados antes da cirurgia, em comparação com o mesmo analgésico dado apenas depois da incisão cirúrgica.
Contexto
A maioria das pessoas sente dor pós-operatória que requer analgésicos opióides fortes. Estes medicamentos estão associados a uma série de efeitos secundários, incluindo depressão respiratória, bradicardia e tensão arterial baixa, bem como vómitos, sonolência, prurido e obstipação. A redução da quantidade de opióides necessária pode limitar estes efeitos secundários e melhorar a satisfação do doente. Em comparação com a administração de analgésicos mais tarde, iniciar a analgesia antes de fazer a primeira incisão cirúrgica pode reduzir a sensibilização à dor e, assim, diminuir a dor pós-operatória. Queríamos saber se administrar opióides antes da cirurgia seria mais eficaz do que administrar o mesmo analgésico após a cirurgia.
Caraterísticas do estudo
Procurámos na literatura médica ensaios controlados aleatorizados (um tipo de estudo em que os participantes são atribuídos a um grupo de tratamento utilizando um método aleatório) em março de 2018. Os participantes foram atribuídos aleatoriamente a um de dois grupos. Um grupo foi tratado com opióides antes do cirurgião realizar a incisão cutânea, enquanto o outro grupo recebeu a mesma medicação após o cirurgião realizar a incisão cutânea. Identificámos 20 ensaios envolvendo um total de 1343 participantes com idades superiores a 15 anos que foram submetidos a uma variedade de cirurgias. Em todos os ensaios à exceção de um, os participantes estiveram sob anestesia geral. Quase todos os participantes eram doentes de baixo risco. Apenas um dos ensaios utilizou uma dose preemptiva de opióides.
Resultados principais
Num pequeno ensaio (40 participantes) que envolveu pessoas submetidas a cirurgia dentária, a utilização de opiáceos preemptivos resultou numa pequena redução da dor nas primeiras seis horas após a cirurgia e às 24 a 48 horas, com base em evidência de baixa qualidade. Este estudo não relatou eventos adversos, nem o consumo de morfina durante 24 horas.
Para os opióides preventivos, iniciados antes da primeira incisão e continuados ao longo do primeiro dia após a cirurgia, a dor nas primeiras seis horas pós-operatórias foi semelhante a quando a primeira dose de opióides foi administrada apenas após a primeira incisão (10 estudos; 706 participantes). A dor pós-operatória às 24 e às 48 horas após a cirurgia foi semelhante entre grupos (9 estudos; 668 participantes). A evidência para ambas as conclusões foi de qualidade moderada. Estes achados foram apoiados por evidência de baixa qualidade ou de muito baixa qualidade. Uma redução no consumo de morfina às 24 horas foi demasiado pequena para ser clinicamente relevante (11 estudos; 526 participantes). Nem todos os estudos relataram eventos adversos, mas o número de participantes com depressão respiratória (4 estudos; 433 participantes), frequência cardíaca baixa (2 estudos; 112 participantes), ou tensão arterial baixa (2 estudos; 88 participantes) foi similar entre grupos.
Qualidade da evidência
A qualidade da evidência variou de muito baixa a moderada. Os principais problemas relativos aos ensaios incluídos foram o elevado risco de enviesamento devido a limitações na forma como os resultados foram apresentados, na concepção e condução dos estudos, e as grandes variações nos resultados, o que levou a incertezas nos resultados. Consequentemente, não encontrámos evidência convincente de que começar a administração de opióides antes da cirurgia reduza a intensidade da dor pós-operatória ou a necessidade de opióides após a cirurgia.
Traduzido por: Beatriz Leal, Serviço de Anestesiologia, Instituto Português de Oncologia de Lisboa Francisco Gentil, com o apoio da Cochrane Portugal.