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Os tratamentos endodônticos (tratamento de canais radiculares) de visita única ou múltiplas são igualmente eficazes, independentemente da parte mole no centro do dente que contém nervos e vasos sanguíneos (polpa dentária) estar vital (viva) ou não vital (morta).
Ambas as abordagens de tratamento estão frequentemente associadas a alguma dor a curto prazo após o tratamento.
O que é o tratamento de canais radiculares?
O tratamento de canais radiculares é um procedimento comum em medicina dentária que é necessário quando a polpa dentária está irreversivelmente danificada. O tratamento dos canais radiculares é considerado bem sucedido quando não há sintomas (como dor), quando as radiografias não mostram sinais de danos no osso e nem nos tecidos de suporte do dente e quando não há sinais de infeção na gengiva (como inchaço ou fístula (um canal anormal)).
Como são efetuados os tratamentos de canais radiculares?
O tratamento de canais radiculares pode ser realizado numa ou mais consultas. O dente, depois de isolado da saliva através da colocação de um lençol de borracha ("dique") à sua volta, é aberto através da coroa (parte visível do dente) com uma broca, a polpa é acedida e removida. De seguida, o canal é desinfetado antes de ser selado com um material de preenchimento.
Antigamente estes procedimentos eram efetuados em duas ou mais visitas, entre as quais se colocava uma pequena quantidade de medicamento nos canais para matar quaisquer bactérias remanescentes, mas atualmente os tratamentos de visita única sem a utilização de qualquer medicação entre consultas são frequentemente preferidos.
O que pretendíamos descobrir?
Queríamos saber se o tratamento de canais realizado numa única consulta era melhor, igual ou pior do que o tratamento de canais efetuado em duas ou mais consultas em termos de sucesso do tratamento e de probabilidade de complicações após o tratamento.
O que fizemos?
Procurámos estudos que investigassem o sucesso e as complicações do tratamento de canais de visita única versus o tratamento de canais em visitas múltiplas em dentes permanentes (adultos). Comparámos os resultados dos estudos relevantes e classificámos a nossa confiança na evidência com base em fatores como a metodologia e o tamanho da amostra dos estudos.
Que estudos encontrámos?
Encontrámos 47 estudos com um total de 5.805 participantes. Os estudos compararam o tratamento de canais radiculares realizado numa única consulta com o tratamento de canais radiculares realizado em duas ou mais consultas em dentes permanentes vitais, dentes permanentes não vitais ou ambos. O estudo maior envolveu 390 dentes e o estudo mais pequeno envolveu 26 dentes. Os estudos foram conduzidos em países diferentes, com o maior número (12) na Índia.
O que é que os estudos demonstraram?
O facto de os dentes serem tratados numa única consulta ou em várias consultas pode não ter qualquer efeito na probabilidade de extração (remoção) dos dentes, mas os resultados são muito incertos (evidência de dois estudos). Os tratamentos de visita única e de visitas múltiplas não parecem ter um resultado diferente quando são avaliados com radiografias efetuadas um ano após o tratamento (evidência de 13 estudos).
Os participantes tratados em várias consultas têm provavelmente menos probabilidade de sentir dor na primeira semana após o início do tratamento do que os participantes tratados numa única consulta (evidência de cinco estudos).
Parece não haver diferença entre o tratamento com uma única visita e o tratamento com múltiplas visitas para os outros desfechos (se há ou não dor após a obturação e a intensidade dessa dor, uso de analgésicos, inchaço e se existe ou não fístula), mas estamos incertos quanto a estes resultados.
Quais são as limitações desta evidência?
Estamos moderadamente confiantes nas conclusões relativas ao sucesso radiológico do tratamento após um ano, que não difere consoante o tratamento tenha sido efetuado numa única visita ou em várias visitas. Da mesma forma, estamos moderadamente confiantes na conclusão de que a dor durante a primeira semana após o tratamento é mais provável com o tratamento de visita única. No entanto, é possível que existam algumas falhas na forma como os estudos foram realizados que possam ter afetado os resultados.
Não estamos confiantes quanto aos resultados para os outros desfechos porque a evidência tem por base poucos casos e os resultados variaram muito entre os estudos, alguns dos quais tinham falhas na forma como foram conduzidos.
Quão atualizada se encontra esta evidência?
Esta revisão atualiza as versões anteriores publicadas em 2007 e 2016. Pesquisámos evidência até abril de 2022.
Tal como nas duas versões anteriores da revisão, não existem atualmente provas que sugiram que um regime de tratamento (TCR de visita única ou de visitas múltiplas) seja mais eficaz do que o outro. Nenhum dos regimes pode prevenir dor e outras complicações no período pós-operatório de 12 meses. Existe evidência de certeza moderada de maior proporção de participantes que relatam dor dentro de uma semana nos grupos de visita única comparado com os grupos de visitas múltiplas. Em contraste com os resultados da última versão da revisão, não houve diferenças no uso de analgésicos.
O tratamento dos canais radiculares (TCR), ou tratamento endodôntico, é um procedimento comum em Medicina Dentária. As principais indicações para o TCR são pulpite irreversível e necrose da polpa dentária com origem em processos cariosos, dentes fissurados ou fraturados, ou trauma dentário. Um TCR de sucesso caracteriza-se pela ausência de sintomas (nomeadamente dor) e sinais clínicos (nomeadamente edema ou fístula) em dentes sem evidência radiográfica de envolvimento periodontal (ou seja, ligamento periodontal mantido). O sucesso do TCR depende de inúmeras variáveis relacionadas com as condições pré-operatórias do dente, assim como do procedimento endodôntico. O TCR pode ser realizado numa visita única, que envolve a obturação do sistema de canais radiculares (preenchimento e selamento) imediatamente após a instrumentação e irrigação, ou com uma abordagem de visitas múltiplas, em que o tratamento é concluído em duas ou mais sessões e a obturação é realizada na última sessão. Esta revisão atualiza as versões anteriores publicadas em 2007 e 2016.
Avaliar os riscos e benefícios da conclusão do tratamento de canais radiculares (TCR) numa única visita em comparação com o TCR em duas ou mais visitas, com ou sem medicação, em pessoas com mais de 10 anos de idade.
Usámos métodos de pesquisa padrão da Cochrane. A última data de pesquisa foi 25 de abril de 2022.
Incluímos ensaios clínicos aleatorizados e ensaios clínicos quase-aleatorizados em pessoas com indicação para TCR, que comparassem a realização de TCR numa única visita com TCR em duas ou mais visitas.
Seguimos as recomendações metodológicas padrão da Cochrane. Os nossos desfechos primários foram: 1. extração do dente e 2. falha radiológica após pelo menos um ano (isto é, radiotransparência periapical). Os nossos desfechos secundários foram: 3. dor pós-operatória e pós-obturação; 4. inchaço ou exacerbação; 5. uso de analgésicos e 6. presença de trajeto fistuloso ou fístula após pelo menos um mês. Usámos o GRADE para avaliar a certeza da evidência para cada desfecho.
Excluímos cinco estudos que foram incluídos na versão anterior da revisão porque não cumpriam a norma atual de procedimentos (ou seja, isolamento com dique de borracha e irrigação com hipoclorito de sódio).
Incluímos 47 estudos com 5.805 participantes e 5.693 dentes analisados. Classificámos 10 estudos como baixo risco de viés, 17 como alto risco de viés e 20 como risco de viés indefinido.
Apenas dois estudos relataram dados sobre extração dentária. Não encontrámos evidência de diferenças entre o tratamento numa única visita ou o tratamento em várias visitas, mas temos uma certeza muito baixa sobre os resultados (risco relativo (RR) 0,46, intervalo de confiança (IC) de 95% 0,09 a 2,50; I 2 = 0%; 2 estudos, 402 dentes). Não encontrámos evidência de diferenças entre o tratamento de visita única e o tratamento em visitas múltiplas em termos de falha radiológica (RR 0,93, IC 95% 0,81 a 1,07; I 2 = 0%; 13 estudos, 1.505 dentes; evidência de qualidade moderada).
Existe evidência de que a proporção de participantes que relatam dor dentro de uma semana é maior nos grupos de visita única comparativamente aos grupos de visitas múltiplas (RR 1,55, IC 95% 1,14 a 2,09; I 2 = 18%; 5 estudos, 638 dentes; evidência de qualidade moderada).
Não encontrámos nenhuma evidência de diferenças na proporção de participantes que relataram dor até 72 horas pós-obturação (RR 0,97, IC 95% 0,81 a 1,16; I 2 = 70%; 12 estudos, 1.329 dentes; evidência de baixa qualidade), intensidade da dor até 72 horas pós-obturação (diferença de médias (MD) 0.26, IC 95% -4,76 a 5,29; I 2 = 98%; 12 estudos, 1.258 dentes; evidência de baixa qualidade) ou dor uma semana após a obturação (RR 1,05, IC 95% 0,67 a 1,67; I 2 = 61%; 9 estudos, 1.139 dentes; evidência de qualidade muito baixa). Não encontrámos nenhuma evidência de diferenças na incidência de inchaço ou exacerbação (RR 0,56 IC 95% 0,16 a 1,92; I 2 = 0%; 6 estudos; 605 dentes; evidência de qualidade muito baixa), uso de analgésicos (RR 1,25 IC 95% 0.75 a 2,09; I 2 = 36%; 6 estudos, 540 dentes; evidência de qualidade muito baixa) ou presença de trajeto fistuloso ou fístula (RR 1,00, IC 95% 0,24 a 4,28; I 2 = 0%; 5 estudos, 650 dentes; evidência de qualidade muito baixa).
A análise de subgrupo não encontrou diferenças entre TCR de visita única e de visita múltipla para os desfechos considerados, exceto a proporção de participantes que relataram dor pós-tratamento no prazo de uma semana, que foi maior nos grupos de visita única para dentes vitais (RR 2,16, IC 95% 1,39 a 3,36; I 2 = 0%; 2 estudos, 316 dentes), e quando a instrumentação era mecanizada (RR 1,80, IC 95% 1,10 a 2,92; I 2 = 56%; 2 estudos, 278 dentes).
Traduzido por: Carlota Duarte de Mendonça, Bruno Rosa, Joana Faria Marques, João Silveira e António Mata, Centro de Estudos de Medicina Dentária Baseada na Evidência, Faculdade de Medicina Dentária da Universidade de Lisboa. Revisão final: Ricardo Manuel Delgado, Knowledge Translation Team, Cochrane Portugal.