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As mulheres que desenvolvem diabetes gestacional têm um maior risco de sofrer complicações durante a gravidez e o parto, bem como de desenvolver diabetes mais tarde na vida. Os bebés de mães com diabetes gestacional podem ser maiores do que deveriam ser e podem sofrer lesões à nascença. Estes bebés correm o risco de sofrer de diabetes, mesmo quando são crianças ou jovens adultos. O número de mulheres diagnosticadas com diabetes gestacional está a aumentar em todo o mundo, pelo que é importante encontrar formas simples e económicas de evitar que as mulheres desenvolvam esta doença.
O mio-inositol é um açúcar natural encontrado em cereais, milho, vegetais verdes e carne, que tem um papel na sensibilidade do corpo à insulina.
O que pretendíamos descobrir?
Queríamos descobrir se o mio-inositol é um suplemento dietético pré-natal eficaz para prevenir a diabetes gestacional em mulheres grávidas.
O que fizemos?
Procurámos estudos que comparassem o mio-inositol (administrado isoladamente ou em combinação com outro tratamento) com nenhum tratamento ou com outro tratamento. Comparámos e resumimos os resultados dos estudos e classificámos a nossa confiança na evidência com base em fatores como a metodologia e o tamanho dos estudos.
O que descobrimos?
Encontrámos sete estudos que incluíram 1319 mulheres que estavam entre as 10 e as 24 semanas de gravidez.
Resultados principais
Não sabemos ao certo se a suplementação com mio-inositol está associada a uma redução na taxa de diabetes gestacional. No entanto, o mio-inositol pode estar associado a uma redução dos distúrbios hipertensivos da gravidez. Não sabemos ao certo se a suplementação com mio-inositol diminui o número de bebés que nascem grandes para a idade gestacional.
Os estudos não forneceram qualquer informação sobre o número de bebés que morreram (antes do nascimento ou pouco depois), depressão ou diabetes tipo 2 subsequente ao parto. Não se registaram efeitos adversos maternos da terapêutica nos cinco estudos que referiram este resultado; os outros dois estudos não mencionaram este resultado.
Não sabemos ao certo qual o efeito da suplementação com mio-inositol no aumento de peso durante a gravidez ou em bebés com níveis baixos de glucose no sangue. Esta revisão não encontrou qualquer impacto noutros resultados, tais como o risco de ter uma cesariana ou um bebé grande. Isto pode dever-se ao facto de os estudos serem demasiado pequenos para detetar diferenças nestes resultados e de os resultados não terem sido comunicados por todos os estudos. No entanto, o mio-inositol pode estar associado a uma redução da taxa de parto pré-termo em comparação com o grupo de controlo.
Os estudos incluídos não referiam muitos outros resultados relevantes para a mãe e para o bebé, nem tinham quaisquer dados relativos a resultados a longo prazo para a mãe ou para o bebé, ou ao custo para os serviços de saúde.
Não existem evidências suficientes que confirmem que a administração de mio-inositol como suplemento alimentar durante a gravidez previne a diabetes gestacional. No entanto, o mio-inositol pode prevenir as perturbações hipertensivas (pressão arterial elevada) da gravidez e o parto prematuro. São necessários mais ensaios clínicos aleatórios controlados, de grande dimensão e bem concebidos, para avaliar a eficácia do mio-inositol na prevenção da diabetes gestacional e na melhoria de outros resultados de saúde para as mães e os seus bebés.
Quais são as limitações destas evidências?
Temos pouca confiança na evidência porque não há estudos suficientes para ter certeza sobre os resultados e muitos dos resultados da nossa revisão não foram apresentados nos estudos que identificámos. Os estudos também se limitaram a populações de locais com rendimentos elevados, pelo que os resultados podem não ser aplicáveis a outras populações. Os estudos também tinham algumas limitações na forma como descreviam os métodos.
Qual é o nível de atualização destas evidências?
A evidência encontra-se atualizada até dezembro de 2022.
As evidências dos sete estudos mostram que a suplementação dietética pré-natal com mio-inositol durante a gravidez pode reduzir a incidência de diabetes gestacional, distúrbios hipertensivos da gravidez e parto prematuro. Dados limitados sugerem que a suplementação com mio-inositol pode não reduzir o risco de um recém-nascido grande para a idade gestacional.
As evidências atuais baseiam-se em estudos pequenos que não foram potenciados para detetar diferenças em resultados como a mortalidade perinatal e a morbilidade infantil grave. Seis dos estudos incluídos foram realizados em Itália e um na Irlanda, o que suscita preocupações quanto à possibilidade de generalização a outros contextos. Há evidência de inconsistência entre as doses de mio-inositol, o momento da administração e a população estudada. Consequentemente, reduzimos o grau de certeza das evidências para muitos resultados para um grau de certeza baixo ou muito baixo.
Encorajamos a realização de mais estudos sobre esta intervenção pré-natal promissora para a prevenção da diabetes gestacional que devem incluir mulheres grávidas de diferentes etnias e diversos fatores de risco. O mio-inositol em diferentes doses, frequência e momento de administração, deve ser comparado com placebo, dieta e exercício, e intervenções farmacológicas. Deve ser considerado um seguimento de longo prazo e os resultados devem incluir potenciais riscos, tais como efeitos adversos.
A diabetes gestacional com início ou reconhecimento inicial durante a gravidez é um problema crescente em todo o mundo. O mio-inositol, um isómero do inositol, é um açúcar natural que se encontra habitualmente nos cereais, no milho, nas leguminosas e na carne. O mio-inositol é um dos mediadores intracelulares da sinalização da insulina e está correlacionado com a sensibilidade à insulina na diabetes tipo 2. O potencial efeito benéfico da melhoria da sensibilidade à insulina sugere que o mio-inositol pode ser útil para as mulheres na prevenção da diabetes gestacional. Esta revisão é uma atualização da revisão publicada em 2015.
Avaliar se a suplementação dietética pré-natal com mio-inositol é segura e eficaz, para a mãe e para o feto, na prevenção da diabetes gestacional.
Pesquisámos no Registo de Ensaios Clínicos da «Cochrane Pregnancy and Childbirth», no ClinicalTrials.gov , no ICTRP da OMS (17 de março de 2022) e nas listas de referências dos estudos encontrados.
Incluímos ensaios clínicos aleatórios controlados (RCTs) publicados e não publicados, incluindo ensaios clínicos aleatórios por cluster (cluster-RCTs) e resumos de conferências, que avaliaram os efeitos do mio-inositol na prevenção da diabetes gestacional em mulheres grávidas. Incluímos estudos que compararam qualquer dose de mio-inositol, isoladamente ou numa preparação combinada, com nenhum tratamento, placebo ou outra intervenção. Os ensaios quasi-aleatórios e cruzados (do original cross-over design) não foram incluídos. Excluímos as mulheres com diabetes tipo 1 ou tipo 2 pré-existente.
Dois autores de revisão fizeram a seleção dos estudos a serem incluídos, extraíram os dados e avaliaram o risco de viés de cada estudo, de forma independente. Verificámos a precisão das informações Avaliamos o grau de confiança da evidência usando a abordagem GRADE.
Incluímos sete ensaios clínicos aleatórios controlados (um realizado na Irlanda e seis realizados em Itália) que incluíram 1319 mulheres com 10 a 24 semanas de gravidez no início dos estudos. Os estudos tinham amostras relativamente pequenas e o risco geral de viés era baixo.
Para os resultados maternos primários, a meta-análise mostrou que o mio-inositol pode reduzir a incidência de diabetes gestacional (risco relativo (RR) 0,53, intervalo de confiança 95% (IC) 0,31 a 0,90; 6 estudos, 1140 mulheres) e distúrbios hipertensivos da gravidez (RR 0,34, IC 95% 0,19 a 0,61; 5 estudos, 1052 mulheres). No entanto, a certeza nesta evidência foi baixa a muito baixa. Para os resultados neonatais primários, apenas um estudo mediu o risco de um recém-nascido grande para a idade gestacional e descobriu que o mio-inositol estava associado tanto a benefícios quanto a danos consideráveis (RR 1,40, IC 95% 0,65 a 3,02; 1 estudo, 234 bebés; evidência de baixo grau de certeza). Nenhum dos estudos incluídos relatou os outros resultados neonatais primários (mortalidade perinatal, mortalidade ou morbilidade composta).
Para os resultados maternos secundários, não estamos certos sobre o efeito do mio-inositol no ganho de peso durante a gravidez (diferença média (DM) -0,25 quilograma (kg), IC 95% -1,26 a 0,75 kg; 4 estudos, 831 mulheres) e no trauma perineal (RR 4,0, IC 95% 0,45 a 35,25; 1 estudo, 234 mulheres) porque a evidência foi avaliada como sendo de muito baixo grau de certeza. Além disso, o mio-inositol pode resultar em pouca ou nenhuma diferença na taxa de cesariana (RR 0,91, IC 95% 0,77 a 1,07; 4 estudos, 829 mulheres; evidência de baixo grau de certeza). Nenhum dos estudos incluídos apresentou os outros resultados maternos secundários (depressão pós-natal e o subsequente desenvolvimento de diabetes mellitus tipo 2 ). Para os resultados neonatais secundários, a meta-análise não mostrou hipoglicemia neonatal (RR 3,07, IC 95% 0,90 a 10,52; 4 estudos; 671 bebés; evidência de muito baixo grau de certeza). No entanto, o mio-inositol pode estar associado a uma redução na incidência de parto pré-termo (RR 0,35, IC 95% 0,17 a 0,70; 4 estudos; 829 bebés). Não havia dados suficientes para diversos resultados secundários maternos e neonatais, e não foram apresentados dados para nenhum dos resultados a longo prazo, na infância ou na idade adulta, nem para os resultados da utilização dos serviços de saúde.
Traduzido por: Dulce Estêvão, Escola Superior de Saúde da Universidade do Algarve. Revisão final: Ricardo Manuel Delgado, Knowledge Translation Team, Cochrane Portugal.