Quais são os riscos das terapias para tratar a esclerose múltipla?

Mensagens-chave

- As imunoterapias usadas para tratar a esclerose múltipla parecem não aumentar eventos graves de saúde, em comparação com medicamentos simulados (placebo).

- Muitos desses medicamentos têm efeitos indesejados e, em alguns deles, mais pessoas incluídas nos estudos desistiram devido aos efeitos colaterais, em comparação aos medicamentos simulados.

- Esses resultados são apenas parcialmente confiáveis, ou mesmo não confiáveis, pois eventos graves de saúde são relativamente raros em pessoas com esclerose múltipla, tornando o problema difícil de estudar. Além disso, os eventos graves de saúde não foram bem relatados nos estudos.

Qual é a condição?

A esclerose múltipla (EM) afeta o cérebro e a medula espinhal. A EM afeta mais mulheres do que homens. Na EM, o sistema imunológico ataca a bainha que cobre os nervos do corpo e enfraquece sua função. Algumas pessoas com EM grave podem até não conseguir usar bem os braços ou as pernas por algum tempo, mas geralmente se recuperam. A incapacidade, como dificuldades para caminhar, pode surgir em algumas pessoas que sofrem muitos surtos ao longo dos anos.

Como a condição é tratada?

Existem vários tratamentos que modulam o sistema imunológico e que podem ajudar a acelerar a recuperação de surtos e melhorar o curso da doença.

O que queríamos descobrir?

Nosso objetivo foi investigar os riscos dos medicamentos usados para tratar a EM. Queríamos avaliar todos os tipos de eventos de saúde graves, por exemplo, internações hospitalares ou eventos que fizeram as pessoas pararem de tomar a medicação. Queríamos também investigar eventos de saúde em órgãos específicos do corpo.

O que nós fizemos?

Buscamos estudos que investigassem medicamentos com o objetivo de melhorar o curso da EM, em comparação com outros medicamentos ou Placebo, em pessoas com episódios recorrentes da doença.

O que nós encontramos?

Eventos graves de saúde foram encontrados em cerca de uma em cada nove pessoas que receberam placebo durante um ou dois anos. Os seguintes medicamentos não aumentaram esses eventos: interferon beta-1a (Avonex), fumarato de dimetila, acetato de glatirâmero, teriflunomida, ocrelizumabe, ozanimod, interferon beta-1b, interferon beta-1a (Rebif), natalizumabe, fingolimode e laquinimod. Não podemos firmar se os seguintes medicamentos causam mais eventos graves de saúde do que o placebo, porque os estudos foram pequenos ou houve poucos eventos (para cladribina, siponimod, ofatumumabe e rituximabe). Estamos muito inseguros sobre daclizumabe, imunoglobulinas, fumarato de diroximel, peg-interferon beta-1a, alemtuzumabe, interferons e azatioprina porque as evidência sobre eventos graves de saúde eram de qualidade muito baixa.

Efeitos indesejados que fizeram com que as pessoas parassem de tomar o medicamento foram encontrados em uma em cada 16 pessoas que receberam placebo por um ou dois anos. Os seguintes medicamentos podem ter aumentado essas desistências: teriflunomida, acetato de glatirâmero, fingolimode, interferon beta-1a (Rebif), daclizumabe e interferon beta-1b. Não podemos dizer se o ofatumumabe causa mais desistência do que o placebo porque os estudos foram pequenos ou houve poucos eventos. Não temos muita certeza sobre fumarato de diroximel, alemtuzumabe, metotrexato, corticosteroides, ozanimod, natalizumabe, ocrelizumabe, fumarato de dimetila, siponimod, rituximabe, cladribina, mitoxantrona, interferons, ciclofosfamida, laquinimod, interferon beta-1a (Avonex), imunoglobulinas, peg-interferon beta-1a e azatioprina porque as evidência sobre desistências foram de qualidade muito baixa.

Quais são as limitações das evidências?

A maioria das evidência veio de estudos conduzidos de maneiras que podem ter introduzido erros em seus resultados, incluindo o fato de que os danos não foram bem relatados. Além disso, eventos graves de saúde e efeitos indesejados são raros em pessoas com EM e, portanto, difíceis de estudar.

Até que ponto estas evidências estão atualizadas?

Esta revisão está atualizada até março de 2022.

Conclusão dos autores: 

Encontramos principalmente evidência de certeza baixa e muito baixa de que os medicamentos utilizados ​​para tratar esclerose múltipla (EM) podem não aumentar a ocorrência de eventos adversos graves, mas podem aumentar as desistências em comparação ao placebo. Os resultados sugerem que não há diferença importante na ocorrência de EAGs entre medicamentos de primeira e segunda linha e entre medicamentos orais, injetáveis ou infundidos, em comparação com placebo.

Nossa revisão, juntamente com outros trabalhos na literatura, confirma relatos de baixa qualidade de eventos adversos em ECRs de intervenções. No mínimo, estudos futuros devem seguir as recomendações do CONSORT sobre relatos de problemas relacionados a danos. Para abordar os efeitos adversos, futuras revisões sistemáticas também devem incluir estudos não randomizados.

Leia o resumo na íntegra...
Introdução: 

A esclerose múltipla (EM) é uma doença crônica do sistema nervoso central que afeta principalmente adultos jovens (duas a três vezes mais frequentemente em mulheres do que em homens) e causa uma significativa incapacidade após o início. Embora seja amplamente aceito que as imunoterapias para pessoas com EM diminuam a atividade da doença, ainda há incertezas quanto à segurança relativa dessas doenças.

Objetivos: 

Comparar os efeitos adversos das imunoterapias para pessoas com EM ou síndrome clinicamente isolada (CIS) e classificar esses tratamentos de acordo com seus riscos relativos de efeitos adversos por meio de metanálise em rede.

Métodos de busca: 

Realizamos buscas nas bases de dados CENTRAL, PubMed, Embase, dois outros bancos de dados e registros de ensaios clínicos até março de 2022, além da verificação de referências e busca de citações para identificar estudos adicionais.

Critério de seleção: 

Incluímos participantes com 18 anos de idade ou mais com diagnóstico de EM ou CIS, de acordo com quaisquer critério diagnóstico aceito. Os participantes foram recrutados em ensaios clínicos randomizados (ECRs) que avaliaram um ou mais agentes utilizados no tratamento de EM ou CIS, comparando-os com placebo ou outro agente ativo. Excluímos ECRs nos quais um regime medicamentos foi comparado com um regime diferente do mesmo medicamento, sem outro agente ativo ou placebo como controle.

Coleta dos dados e análises: 

Utilizamos os métodos padrão da Cochrane para extração de dados e meta-análises pareadas. Para as metanálises em rede, utilizamos o conjunto de comandos netmeta no R para ajustar as metanálises em rede de efeitos aleatórios, assumindo uma variância comum entre estudos. Utilizamos a plataforma CINeMA para avaliar a certeza do conjunto de evidências em metanálises em rede pela abordagem GRADE. Consideramos um risco relativo (RR) de 1,5 como um limiar de segurança de não inferioridade em comparação com placebo. Avaliamos a certeza das evidências para desfechos primários dentro das metanálises em rede de acordo com o GRADE, como muito baixa, baixa, moderada ou alta.

Principais resultados: 

Está metanálise em rede incluiu 123 estudos com 57.682 participantes.

Eventos adversos graves (EAGs)

A notificação de EAGs estava disponível em 84 estudos, incluindo 5.696 (11%) eventos em 51.833 (89,9%) participantes de um total de 57.682 participantes em todos os estudos. Com base na frequência absoluta de EAGs, nosso limite de não inferioridade (risco aumentado em até 50%) significou que não mais do que 1 em 18 pessoas adicionais teria um EAG em comparação ao placebo.

Evidência de baixa certeza sugeriram que três medicamentos podem diminuir os EAGs em comparação ao placebo (RR, intervalo de confiança [IC] de 95%): interferon beta-1a (Avonex) (0,78, 0,66 a 0,94); fumarato de dimetila (0,79, 0,67 a 0,93) e acetato de glatirâmero (0,84, 0,72 a 0,98).

Vários medicamentos atenderam ao nosso critério de não inferioridade em comparação ao placebo: evidência de certeza moderada para teriflunomida (1,08, 0,88 a 1,31); evidência de baixa certeza para ocrelizumabe (0,85, 0,67 a 1,07), ozanimod (0,88, 0,59 a 1,33), interferon beta-1b (0,94, 0,78 a 1,12), interferon beta-1a (Rebif) (0,96, 0,80 a 1,15), natalizumabe (0,97, 0,79 a 1,19), fingolimode (1,05, 0,92 a 1,20) e laquinimod (1,06, 0,83 a 1,34); evidência de certeza muito baixa para daclizumab (0,83, 0,68 a 1,02).

A não inferioridade em relação ao placebo não foi atingida devido à imprecisão para os outros medicamentos: evidência de baixa certeza para cladribina (1,10, 0,79 a 1,52), siponimod (1,20, 0,95 a 1,51), ofatumumabe (1,26, 0,88 a 1,79) e rituximabe (1,01, 0,67 a 1,52); evidência de certeza muito baixa para imunoglobulinas (1,05, 0,33 a 3,32), fumarato de diroximel (1,05, 0,23 a 4,69), peg-interferon beta-1a (1,07, 0,66 a 1,74), alemtuzumab (1,16, 0,85 a 1,60), interferons (1,62, 0,21 a 12,72) e azatioprina (3,62, 0,76 a 17,19).

Retiradas devido a eventos adversos

A notificação de retiradas devido a eventos adversos estava disponível em 105 estudos (85,4%), incluindo 3.537 (6,39%) eventos em 55.320 (95,9%) pacientes de um total de 57.682 pacientes em todos os estudos. Com base na frequência absoluta de EAGs, nosso limite de não inferioridade (risco aumentado em até 50%) significou que não mais do que 1 em 31 pessoas adicionais teria um EAG em comparação ao placebo.

Nenhum medicamento reduziu as retiradas devido a eventos adversos quando comparado ao placebo.

Houve evidência de certeza muito baixa (o que significa que as estimativas não são confiáveis) de que dois medicamentos atenderam ao nosso critério de não inferioridade em relação ao placebo, assumindo um limite superior de IC de 95% de 1,5: fumarato de diroximel (0,38, 0,11 a 1,27) e alemtuzumabe (0,63, 0,33 a 1,19).

A não inferioridade com placebo não foi alcançada devido à imprecisão para os seguintes medicamentos: evidência de baixa certeza para ofatumumabe (1,50, 0,87 a 2,59); evidência de certeza muito baixa para metotrexato (0,94, 0,02 a 46,70), corticosteroides (1,05, 0,16 a 7,14), ozanimod (1,06, 0,58 a 1,93), natalizumabe (1,20, 0,77 a 1,85), ocrelizumabe (1,32, 0,81 a 2,14), fumarato de dimetila (1,34, 0,96 a 1,86), siponimod (1,63, 0,96 a 2,79), rituximabe (1,63, 0,53 a 5,00), cladribina (1,80, 0,89 a 3,62), mitoxantrona (2,11, 0,50 a 8,87), interferons (3,47, 0,95 a 12,72) e ciclofosfamida (3,86, 0,45 a 33,50).

Onze medicamentos podem ter aumentado as retiradas devido a eventos adversos em comparação com o placebo: evidência de baixa certeza para teriflunomida (1,37, 1,01 a 1,85), acetato de glatirâmero (1,76, 1,36 a 2,26), fingolimode (1,79, 1,40 a 2,28), interferon beta-1a (Rebif) (2,15, 1,58 a 2,93), daclizumabe (2,19, 1,31 a 3,65) e interferon beta-1b (2,59, 1,87 a 3,77); evidência de certeza muito baixa para laquinimod (1,42, 1,01 a 2,00), interferon beta-1a (Avonex) (1,54, 1,13 a 2,10), imunoglobulinas (1,87, 1,01 a 3,45), peg-interferon beta-1a (3,46, 1,44 a 8,33) e azatioprina (6,95, 2,57 a 18,78); no entanto, evidência de certeza muito baixa não são confiáveis.

Análises de sensibilidade incluindo apenas estudos com baixo viés de atrito, dose do medicamento acima da mediana do grupo ou apenas pacientes com EM recorrente-remitente ou CIS, e análises de subgrupos por tratamentos anteriores modificadores da doença não alteraram esses resultados.

Classificações

Nenhum medicamento produziu scores P consistentes no quartil superior da probabilidade de ser melhor do que outros para desfechos primários e secundários.

Notas de tradução: 

Tradução do Cochrane Brazil Maurício Reis Pedrosa e Aline Rocha. Contato: tradutores.cochrane.br@gmail.com

Tools
Information